ENTRE O CÉU E O INFERNO

A natureza humana é complexa, sabemos. O dia a dia é mais eloquente que a própria literatura clássica. Podemos explicar Lady Macbeth, figura sinistra, ou Otelo, de Shakespeare, uma Capitu, de Machado de Assis, um Rodion Raskolnikov, de Dostoievski, mas como explicar uma Suzane Richthofen ou o casal Nardoni?

Pois bem, há algum tempo, um publicitário de São Paulo, assassinou o zelador de seu edifício por “desavenças, coisas de condomínio. Nem todos os condôminos aceitam a maneira de administrar”. Tê-lo matado por motivo banal nem seria o mais estarrecedor, supostamente com o auxílio da esposa, de 42 anos, mas o requinte de havê-lo esquartejado na casa de veraneio no litoral paulista, depois de carregar sorrateiramente o corpo numa mala, um dia antes. O que mais espanta é que alguns vizinhos teriam informado que o criminoso era pessoa simpática e afável. Será que tanta gente assim - nossos vizinhos, colegas, amigos ou parentes – carregam dentro de si a semente do mal, capaz de brotar e rapidamente crescer, se o solo tornar-se fértil ou se for adequadamente adubada? É difícil de aceitar a hipótese, mas não creio que seja coisa absurda.

Quando a gente assiste a filmes do período das atrocidades nazistas ou das mais recentes e cruentas guerras tribais africanas, por exemplo, minha mulher costuma comentar que não compreende certas maldades humanas: sempre respondo que o homem trafega entre o céu e o inferno, com potencial para tudo. Ademais, em grande parte dos exemplos históricos, o centro dos desequilíbrios é a disputa pelo poder e o poder abusivo corrompe, deforma e destrói. Mas, nos casos do quotidiano, ali na esquina, percebemos que a humanidade é ainda primitiva e nossas instituições muito jovens. Não dá pra se iludir. A educação ajuda, uma sociedade equilibrada e próspera ajuda, talvez a religião e a severidade da lei ajudem, mas a natureza humana ainda é um campo de guerra entre Deus e o Diabo.