PICLES

Os picles derivam do inglês, Pickles, que, por sua vez, provêm do holandês Pekels, e são conservas de vegetais em vinagre, como o pepino, a cebolinha, a azeitona, a cenoura, as alcaparras, por exemplo. Mas tem também a conserva de ovos de galinha ou de codorna e o fabuloso rollmops, de origem germânica, que é uma conserva de peixe, geralmente arenque (no Brasil, sardinha), enrolado com cebola ou, eventualmente, pepino.

Bem, como não estou a fim de falar sobre Copa do Mundo, Mensalão, Operação Rodin, eleições, assassinatos brutais e outros abalos sísmicos, fico encantado em relembrar os aperitivos habituais da minha geração nos balcões dos bares da cidade, que, não raro, substituíam a janta dos sem-grana, como eu e grande parte da jovem torcida gre-nal dos anos sessenta. Afinal, tais acepipes não têm muito a ver com pobreza, assim como o caldo de cana ou de coco que se tomava na estação dos bondes na Praça Quinze, no centro da urbe, onde também se comia um inesquecível pastel de carne. Só bem mais tarde a gente acabou conhecendo as iguarias de um Pagoda, Lokun, Lajos, Floresta Negra, Rembrandt, Sherazade, Prinz, Napoleon, Treviso, Gambrinus, Dona Maria, Marreta e outros tantos, mais ou menos sofisticados, mas sempre de babar. Atiçado pela lembrança dos picles, não posso evitar a memória dos meus primeiros pratos sofisticados que experimentei mais tarde nos citados restaurantes e em outros cujo nome já nem lembro, tudo novidade, último grito, como se dizia, hoje manjares banais, até de segunda linha: estrogonofe de filé mignon, com muito champignon, coquetel de camarão, brochettes de camarão com arroz à grega, filet mignon com molho “remoulade”, peru à Califórnia e coisas assim, que excitavam. O Lajos destacava-se pelo camarão à grega, o peru à Califórnia e o pato com laranja. No Floresta Negra, pouco depois e também do Fredolino, creio que me esbaldava no estrogonofe de filet mignon, mas não tenho certeza. Também adorava a comida chinesa do Pagoda ou do Lokun, relativamente barata e boa, sabor agridoce. Nunca ouvi falar em restaurante japonês, naquele tempo. Vamos resumir assim, nos anos sessenta – primórdios - picles e mais picles. Depois, cachorro-quente do Zé do Passaporte ou sanduíche de pernil de porco do Matheus, na Rua da Praia, quando sobrava grana, coisa mais rara. Nos anos setenta, com alguns pilas no bolso e namorada firme, restaurante de algum prestígio e bares da moda para comer bolinhos de bacalhau, especialmente.

Mas, vejam como são as coisas, o estrogonofe perdeu muito da sua mística, assim como, para meu gosto, a comida chinesa, que ficou bastante popular e bem mais cara, mas os picles são imortais - com amendoim torrado, castanha de caju, castanha do Pará e queijinho cortado - alimentam o bom papo, dão sustentação ao trago e acicatam o apetite. Não poderíamos imaginar que surgissem iguarias tão deliciosas, da nacionalidades diversas e, muito menos que a pizza - prato de resistência dos aniversários infantis - deixasse de ser aquele bolo alto e duro recoberto de queijo, tomate e sardinha para alcançar os desvanecedores patamares da melhor degustação contemporânea. Coisas do progresso. Graças a Deus churrasco sempre foi de primeira. Só quero relembrar que, na minha era, comia-se coração de galinha só mesmo em canja.