O genial Hervé Cordovil
“Sabiá lá na gaiola fez um buraquinho, voou, voou, voou, voou. E a menina que gostava tanto do bichinho, chorou, chorou, chorou, chorou (...)”. Lembro-me com nitidez de ouvir e cantar essa canção durante a minha primeira infância, lá pelos idos da década de 1970. O que eu não fazia a menor ideia àquela época era que se tratava de um dos inúmeros sucessos de um compositor nascido em Viçosa-MG – cidade que iria me acolher duas décadas depois.
“Sabiá lá na gaiola” é uma composição do viçosense Hervé Cordovil em parceria com Mário Vieira. Para quem não sabe, se estivesse vivo, Hervé completaria 100 anos na última segunda-feira. Ele nasceu em Viçosa em 3 de fevereiro de 1914 e faleceu em São Paulo em 16 de julho de 1979, aos 65 anos. O ilustre viçosense deixou centenas de composições, muitas delas em parceria com nomes famosos da Música Popular Brasileira, como Luiz Gonzaga, Adoniran Barbosa, Noel Rosa e Lamartine Babo. Outros nomes igualmente famosos as interpretaram, a exemplo de Carmem Miranda, Carmélia Alves, Carlos Gardel, Dick Farney, Francisco Alves e Isaura Garcia.
Das minhas lembranças da infância, tem ainda outra música dele que adorava ouvir e cantar: “Vida de Viajante” (“minha vida é andar por este país pra ver se um dia descanso feliz”), uma das parcerias de Hervé com o Rei do Baião, na maravilhosa voz deste último. No início da adolescência, nos anos 80, quando fui contagiado pelo rock, outra vez fui apresentado a dois grandes sucessos do viçosense, que, além de compositor, era maestro e exímio pianista. Foram eles: a versão da fantástica banda Mutantes para “Rua Augusta” (“entrei na Rua Augusta a 120 por hora, botei a turma toda do passeio pra fora; fiz curva em duas rodas sem usar a buzina, parei a quatro dedos da vitrina”), sucesso da Jovem Guarda na voz de Ronnie Cord, seu filho; e a versão da banda Blitz para “Biquíni de Bolinha Amarelinha” (“era um biquíni de bolinha amarelinha tão pequenininho, mal cabia na Ana Maria”), música em inglês que fez muito sucesso na Jovem Guarda depois que Hervé compôs a versão em português.
Na história da MPB Hervé Cordovil é considerado um compositor versátil e genial. Compôs para vários gêneros musicais com a mesma maestria, ao mesmo tempo em que transitou (e continua transitando) com grande aceitação por intérpretes dos mais diversos estilos.
Dois apaixonados por sua obra em Viçosa são o maestro e pianista Rogério Moreira Campos (que já em 2013 montou e dirigiu o show “Hervé Cordovil – Um Viçosense na MPB”) e o advogado, historiador e educador Vicente de Souza Castro. Ambos estão entre os entusiastas que tomaram a frente do projeto de dedicar todo o ano de 2014 às comemorações do centenário do compositor.
Eles e as demais pessoas que estão à frente dessa proposta pretendem não apenas realizar eventos comemorativos em datas específicas, a exemplo de um grande show no Espaço Cultural Fernando Sabino (Centro de Vivência da Universidade Federal de Viçosa). Querem também colocar em prática projetos que possam servir de pesquisa e mesmo apresentar Hervé para as novas gerações. Um deles é a reedição e relançamento do livro “Hervé Cordovil – Um Gênio na Música Popular Brasileira”, da professora viçosense Maria do Carmo Tafuri Paniago. O outro, no qual estou diretamente envolvido como produtor e redator, ao lado de Vicente de Castro e do caricaturista, ilustrador e jornalista Élson de Mello, é o “Hervé na Escola” – uma revista ilustrada em formato de gibi sobre a vida e a obra do compositor, a ser distribuída gratuitamente às escolas de Viçosa e disponibilizada para todo o país em formato de e-book.
Seria fabuloso se tais iniciativas conseguissem o apoio necessário para ser concretizadas. Também seria incrível se as rádios locais pudessem dedicar algum tempinho de sua programação diária para apresentar a seus ouvintes uma parte da riquíssima obra desse gênio viçosense.