Coração Andarilho

Meu coração é andarilho numa alameda de sonhos. Vai de abraços com meus pensamentos, carregam o fastioso vício de desenhar contornos em areia. Semeiam desejos no ar, abraçam as ondas do mar, perdem-se nesse borbulhar no incansável exercício de se propagar e fenecer.

Meu coração caminha à passos largos como quem tem pressa. Talvez não seja urgência, talvez seja medo de que algum recanto, alguma fresta, algum pequeno momento não seja vivido o suficiente antes que as minhas representações se fragmentem e descortinem o nada. Pois essa via de frondosas cerejeiras cintilando de rubro sob um sol de rei, nasceu da boca do delírio de um coração a deriva. E a tal desejada e imprevisível lufada do amor transforma tudo com um simples sopro, um gesto ou um beijo. E o que era árido e escuro agora é fresco e profuso de cores e luzes. Cinge os olhos com uma alegria repentina e nova, semeia as ervas de bom odor.

Vivas e bem vivas são as horas que permaneço em sonhos. Nelas estão o meu melhor sorriso, meu melhor perfume, o meu mais intenso ardor. Limpas e bem limpas são as palavras que saem de minha boca, pois são como uma oração, uma confissão, um sincero agradecimento. E meu coração vai, cada vez mais fundo na real intenção de ser perder. É porque para se encontrar é preciso se perder – já dizia algum louco. Não é só por sorte que se encontra uma gema preciosa num arroio de cascalhos. É preciso ter a intenção de encontrar e ter olhos vivos e a percepção aguçada para não confundir vidro com brilhantes.

Deixei meu coração se perder em meus sonhos aos cuidados dos meus pensamentos. Espero que façam boa jornada e que o sono seja profundo e duradouro. E que esse brilhante dia de rei de ventos amenos e frescos não chegue nunca ao entardecer.