UMA LINDA MULHER

Creio que a gente tem liberdade artística para falar de mulheres ideais, oníricas, utópicas, sem causar qualquer tipo de melindre. É como se falasse de um quadro de Picasso, uma escultura de Rodin, um poema de Fernando Pessoa ou quase isto. A beleza merece um culto especial, tanto quanto o caráter, a força, a inteligência, a sensibilidade e a devoção. A gente só não pode elogiar com alguma empolgação a amiga da nossa companheira, sua colega de trabalho, parente, vizinha ou conhecida. No mais, está liberado, a não ser que a mulher seja nossa secretária, ex-namorada ou que habite também este planeta. Mas, afinal, por que elogiar outra mulher na frente da nossa própria? Agora, literariamente, no plano superior da utopia, creio possível arriscar um pouco, especular, nutrir alguma ideia maluca, porque o assunto é interessante. A beleza é um conceito dinâmico e histórico. Aristóteles a definia como a harmonia das partes que compõem o todo. Mas isto é muito relativo. Minha avó, quando queria elogiar uma mulher qualquer, dizia que estava gordinha; para as poucas não tão queridas, ela costumava dizer, com certo ar de comiseração, “Fulana, como tu estás magrinha”. Era o padrão estético do seu tempo, que, de resto, sobrevive sobretudo entre os operários da construção civil, que não resistem ao desfilar de uma dona mais poderosa de corpo, com peitos, coxões e traseiro avantajados. Gosto é gosto e não se discute. Sei que o brasileiro gosta de “sustância”, como se diz na fronteira. Não é que desgoste, mas meu tipo ideal - obviamente sem considerar minha mulher - ficaria entre Débora Secco, Gisele Bündchen e uma dose de Sabrina Sato, com pitadas, é claro, de Natalie Portman, apenas para dar uma ideia. Não tenho mau gosto, mas creio que, neste padrão, não iria enfrentar concorrência muito acirrada em território nacional. Uma linda mulher no Brasil, possivelmente não seria uma lindona na Europa. Vejam bem, repito à exaustão, estou devaneando, falando em tese, dentro dos amplos lindes da licença poética, que não reprime o apreciar de longas pernas bem torneadas, cintura fina, seios médios, sem excesso de quadris, bundinha de escultura e outros detalhes, que nem seriam propriamente detalhes, mas que não precisam de muita especificação agora. Se a mulher é loira, morena, castanha ou ruiva, isto não é relevante, assim como a idade, a cor da pele ou a origem, mas não há beleza que resista à burrice ou à chatice: isto é um dogma. De qualquer modo, Vinícius de Morais sabia tudo: “As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental”. Notem bem que ele não disse só “beleza”. Com as mulheres, não se iludam os homens, acontece o mesmo, afinal, é para isto que serve a fantasia e é positivo que ela exista livremente e fervilhe. Pode não ser o corpo, o rosto, mas um jeito, uma pegada, um olhar, a postura, o poder, a inteligência ou o humor. Não importa, tudo faz parte do mesmo sonho. E nada disso desmerece o companheiro ou companheira, desde que os viventes não pretendam ingenuamente misturar a ilusão com a realidade, provocando o caos emocional e o impasse. São mundos bem diferentes. Para culminar, afirmo: a melhor mulher é aquela que realmente gosta da gente, espero que as damas também assim pensem, mas este já é outro papo. Na verdade, você, linda mulher, nem precisa estar com a bola toda, mas talvez um amigo, um colega, um vizinho, um passante ache você um desbunde,mas, por alguma razão, nunca irá revelar sua empolgação e devaneio. Pelo sim, pelo não, fique feliz.