Mariposa (Metamorfose II)

Por fim, acaba a metamorfose. Finalmente, e quisera dizer eu, felizmente. Entretanto, os efeitos de tanto tempo vivendo dentro de um casulo causaram resultados surpreendes em mim. Após noites e noites de transformações, a fraqueza do meu ser já se tornou evidente. Sim, a fera me dominou, mas agora, por completo. E essa mariposa negra que me transformei agora sibila, buscando redenção. Tento me lembrar de mim, mas os poucos resquícios que sobraram do meu verdadeiro ser já não conseguem mais trazer de volta aquele que eu era. Sinto muito, mas não consigo. E então como monstro que sou entrego-me à melancolia e começo a me flagelar com lembranças. Lembranças de um inocente ser, quando nem mesmo a personificação em ovo estava visível em mim. Quando a personificação em ovo era considerava loucura, impossível até mesmo de reflexão. Inocente ser, que não esperava a chegava daquela Mariposa que o faria igual ela. Inocente criatura, que não esperava que aquela Mariposa que parecia tão indefesa, o faria ovo. Inocente ovo, que perdido, cego em meio a toda escuridão trazida pela Mariposa Negra, não percebeu que se transformava em lagarta. Inocente lagarta, que quando se percebeu em meio ao breu, já era pupa. Inocente pupa, que possuía olhos tão pequenos que eram incapazes de ver as transformações que continuava sofrendo. Inocente crisálida, que quis contemplar-se de lucidez quando já havia sido dominada. E de tão inocente que era, em uma última tentativa de recuperar sua identidade, construiu um casulo para evitar as desgraças de mundo oferecidas pela mariposa. Queria retroceder todo o processo, queria voltar a ser gente. Ingênuo. O casulo o fez mais mariposa, e logo se viu prestes a voar. Era ser, era terra, queria chão. Mas não aguardava pelo convite de ar da Mariposa Negra e o simples olhar que o causou cegueira o incapacitou de sanidade qualquer. O que sobra, são desculpas a mariposas brancas e ao próprio ser que era. Já não sou mais um ser inocente, apenas um inocente ser. Que agora, deseja apenas liberta-se da Mariposa que o fez inseto. Que agora, como um irônico inseto, foge da luz e procura uma sombra. Quem diria que aquela mariposa de Gregório fosse um dia evitar o prazer pela dor.

...on a rainy day, the Black Moth lands in a tree.

Quoth the Moth, nevermore.