Olhos da noite

*Escrevi esse texto, quando ainda era adolescente. Não sei se de lá para cá, melhorei ou piorei... O fato é que, não gosto muito das coisas que escrevi no passado [não sei se isso é neura minha, ou se de fato todo escritor é assim...] mas sem dúvida elas me ajudaram e muito com o manejo das palavras.

**Esse texto em particular, tem um significado todo especial para mim, pois o tenho guardado (e muito bem guardado, diga-se de passagem) inclusive já com as páginas amareladas do tempo e com a assinatura de Max Martins (um grande expoente da poesia contemporânea em minha terra) dizendo assim : "Um bom poema em prosa!" Isso muito me orgulha! Porque eu era apenas uma menina cheia de sonhos, uma iniciante quando o conheci... E jamais pensei em ouvir um elogio desses de um mestre.

Luzes acesas, cidades mortas... Olhos vivos... Que piscam procurando alguma coisa, varrendo o horizonte, alastrando-se além do que se encontra nas esquinas desertas. Penetrando na noite escura e eternamente interminável, procurando a melodia de uma canção, quem sabe uma voz... Que não seja a do silêncio, a da solidão.

Luzes acesas, nos prédios, nas avenidas, nos bares, nos lugares... Por onde vagueia meu pensamento. E ela, eternamente viva! A garota madrugada que apenas começa amiga de muitos e inimiga de outros tantos.

Enquanto alguns dormem – outros trabalham duramente para garantir o sustento da casa – outros estudam, outros bebem, outros cantam, outros dançam, outros conversam, outros escrevem, outros fazem sexo, outros caem na gandaia, outros riem, outros choram, outros vagueiam pela rua, como loucos de órbitas vazias... Sei lá... Ou simplesmente apreciam os olhos da menina que encanta.

Olhos que se perdem e se encontram simultaneamente, azuis, verdes, amarelados, castanho-amendoados, olhos negros... Que sob a ótica da noite, são todos iguais! Olhos simples que brilham escondidos (disfarçadamente) para que ninguém possa saber a profundidade de seus sonhos! Olhos que fazem da noite, uma menina crescente.

Luzes acesas, a sala vazia, morta... Apenas o chiado da televisão e falta alguém para poder conversar, dizer tudo o que se viu de belo e triste durante o dia. O relógio marca três horas, a essa hora vários olhares já se encontraram, se cruzaram, se despiram, se amaram, se despediram... Vários nasceram, vários morreram, alguns casaram e outros tantos se divorciaram... E a noite continua a mesma, eternamente viva, com olhos antigos, olhos novos, com olhos ricos, olhos pobres, olhos lânguidos, olhos frios...

Luzes acesas, lembranças mortas, saudades... E a madrugada não perdoa. Esquece os olhos passados, vive com olhos presentes (momentâneos) e pensa em olhos futuros. Caminhe junto a ela ou a esqueça! Mãe da noite e de todos os mistérios pulsantes... Dos filhos errantes.

Mãe dos boêmios, dos poetas, dos amantes, dos músicos, dos artistas, dos bêbados, das prostitutas, das cafetinas (e seus bordeis), dos jogadores (e seus cassinos, suas mesas e rodas), dos mendigos, dos loucos... Mãe de todas as figuras exóticas e diferentes – na noite todos se libertam – ou apenas mãe daqueles, que ainda a descobrem.

Luzes acesas, distância viva... “Memórias apagadas...” A voz que ecoa por um grito no passado; que geme num quarto qualquer de hospital, procurando um olhar, um consolo, um afago para confortar a dor... Ou a voz que fala sozinha, no fundo de um quarto escuro, debatendo-se contra as alucinações, “talvez” precisando de ajuda, antes que seja tarde demais para esta vida tão triste.

Enquanto isso... Lá fora, do outro lado da rua, vai findando mais uma madrugada de tantas que já foram... E mãe da noite vai se recolhendo, arrastando os últimos filhos que lhe restam. Todos aqueles que, estão quase na sarjeta, mas, que insistem em tomar a última cerveja.

Lanna Woolf

(22/10/1999)

Lanna Woolf
Enviado por Lanna Woolf em 27/10/2013
Código do texto: T4543767
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.