Quantos tipos de silêncio há?
Peço desculpas aos que me leram ou lerão pelos erros. Escrevi em um dia de total silêncio.
É tão óbvio. Lulu Santos já dizia: “A vida é mesmo assim.” Por que razão estou cansando os que me leem com algo tão corriqueiro. Estranho. Ao acordar e começar a limpar o apartamento tão grande para mim e dois cachorros, fiquei pensando no paradoxo que Deus nos reserva.
Ao chegar, há muitos anos, a esta bela terra, morei e um sótão contaminado de baratas e outras coisas, já que era cheio de móveis velhos, em uma casa riquíssima. Mas, Deus é tão maravilhoso que alimentava a alma daquela menina de seis anos com luares lindos da Tijuca ou Estácio. Sim. Eu, sem que meus tios ricos soubessem, fazia de meu refúgio o telhado, embora acordasse lépida, para ir à escola. Entretanto, ninguém me olhava. A quem importava minha expressão infantil cansada. Foi bom, senão maravilhoso, aprendi, até hoje, a falar com as estrelas e outros astros. Pena que hoje, não veja o suficiente. Eu aprendi o valor do silêncio, até na dimensão sideral.
Mas, Deus sempre transforma o nosso viver. Minha mãe casou-se. O meu padrasto perdeu tudo e fomos morar em um “belo” barraco que os “tios ricos” nos legaram, sob indispensável aluguel. Que lugar lindo para mim. Tinha um jardim – só meu – sobre uma pedreira. O mais incrível, naquele pequeno, recanto nasciam as mais belas margaridas e outras espécies de que não sei o nome. Era, meu paraíso, a essa altura com doze anos e sem condições ou roupas para sair. Queria falar delas. A quem? A ninguém. Naquela época, começavam as saias a subir e eu preocupada com o meu jardim. Aprendi outro tipo de silêncio. O das jóias raras que se guardam só no coração. O silêncio do meu lugar. Só os olhos acostumados podem ver esses tesouros, principalmente quando as rosas sedentas bebem a água da chuva.
Não me importava que fosse de madeira. Não me incomodava de passar roupa (com ferro a carvão) até de madrugada para minha mãe e nós não termos dinheiro, pois o marido dela começara a vender pão de porta em porta. Igualmente, não me incomodavam – claro que tinha medo deles – os escorpiões que teimavam em aparecer no meio dos frangos que minha mãe criava. Como não podia pedir apoio a ninguém, jogava álcool neles e os queimava. Sentia-me, tolamente feliz, porque defendera o meu “castelo” de alguns “dragões”. Nem contar podia pelo fato de minha mãe estar sempre ocupada. Este silêncio passou a acompanhar-me. Minhas alegrias eram pueris. Enquanto outras meninas pensavam em seus primeiros namorados. Eu guardava o silêncio do meu jardim.
Mais tarde –muito mais tarde – pude ver a minha mãe em uma grande casa. Eu tinha um excelente emprego e lecionava à noite, enquanto fazia a segunda faculdade. Naquela casa, onde morava com meu filho – já separada – com pouco mais de vinte e cinco anos, havia um belíssimo jardim, Minha mãe tinha a mão de ouro. Todas as manhãs, antes de ir trabalhar ou levar o menino à escola, eu olhava a profusão de rosas, que me davam segurança e levava em meu coração um pouco daquela beleza que alimentava o meu dia, árido de outros sentimentos, mas rico da beleza que eu tanto amava, lado a lado ao sorriso de meu menino. No entanto, mais uma vez aprendi – como aprendi! – o silêncio. Eu não podia falar de mim. Falavam de mim. Eu era a mulher separada do marido. Criava um filho “sem pai”. Uma aberração, por todos os familiares, ruidosos, que, graças a mim, almoçavam e se divertiam. Eu gostava daquela profusão de risos, mesmo que alguns fossem de mim. Esse silêncio amargo doeu muito em minha alma.
Nos caminhos do tempo, vi-me obrigada a sair daquela casa (casas, pois eram várias), pela violência no Rio. Meu filho, há quinze anos, escolheu o apartamento onde agora moro. Animado, alegre, nunca o vi tão feliz. Estava namorando. Minha mãe não queria deixar a casa. Mas , como meu padrasto já partira, mudamos. Por menos de dois anos, desfrutei do sonho que embalara. Minha mãe fica meses sobre uma cama, tetraplégica. Meu filho casa-se, em quatro meses com outra pessoa. Passarinho lindo, com longs e belas asas, que abandonou o ninho por longo tempo, até a separação.
No ano seguinte à partida de minha mãe, perco o emprego que me garantia o padrão de vida (fui demitida por computador, depois de 27 anos e alguns meses). Meu filho, volta sem nada, apenas radicalmente mudado. Recebe o quarto que era de minha mãe e, ali, passa a ser o seu castelo. Falava o essencial. Só. Mesmo com uma nova namorada, por mais de seis anos( menina bonita e meiga), parece que esta casa não era a escolhida por ele. Entregava-se, por inteiro, à família da menina (era a nova família dele), com quem, repentinamente, desfez a relação. Aprendi um silêncio estranho, pesado, dolorido, o da nulidade, ou seja, como se eu não existisse.
Em compensação, aprendi a conhecer cada pedra do caminho da minha rua, das ruas que me levam às escolas, entre lágrimas, pedindo a Deus forças para continuar. Entre problemas variados, como o da visão e o de locomoção, hoje, vivo neste “castelo” feio, porque estão velhos os móveis e precisa de reformas. São 118 metros quadrados de silêncio diário. Ainda tenho algumas belas plantas, mas apesar de amá-las e aos dois companheiros “Pingo” e “Malhado” (esqueci do passarinho cantador), há um silêncio estranho, que pousou nesta casa e dela não quer se afastar. Meu filho, hoje casado, mora bem longe e já tem um lindo filho. Porém, até hoje, não trouxe a esposa aqui. Deve ser tudo muito feio... Ele tem outras metas. Precisa passear com o Noah e a Bia e família que o adotou.
Comigo fica não a queixa, mas a necessidade de meditar para dissipar este estranho companheiro, insuperável, que, noite e dia, me acompanha. Às vezes, logro êxito, o driblo e o esqueço a um canto. Porém, ele retorna diz:
- Não adianta! Habitamos a mesma casa.
Só tem uma coisa: eu não queria que ele fosse tão concreto. Que ele estivesse em cada parede, em cada amanhecer ou ao sol-poente, repetindo que é o meu único companheiro.
Apesar de tudo, apesar da idade, ainda consigo burlá-lo, de vez em quando, abrindo uma janela para a luz.
Portanto, há vários tipos de silêncio e tenho pouco tempo para aprender a conviver com o de agora. Resta a minha fé em Deus.
Bem sei que há outros silêncios, em mundos, que nunca quisera percorrer. Um, contudo, existe, que, em breve, contarei, que é o que sente, eum uma clínica para pessoas que considram depressivas. Principalmente, quando lé está em um quarto com grades.
É tão óbvio. Lulu Santos já dizia: “A vida é mesmo assim.” Por que razão estou cansando os que me leem com algo tão corriqueiro. Estranho. Ao acordar e começar a limpar o apartamento tão grande para mim e dois cachorros, fiquei pensando no paradoxo que Deus nos reserva.
Ao chegar, há muitos anos, a esta bela terra, morei e um sótão contaminado de baratas e outras coisas, já que era cheio de móveis velhos, em uma casa riquíssima. Mas, Deus é tão maravilhoso que alimentava a alma daquela menina de seis anos com luares lindos da Tijuca ou Estácio. Sim. Eu, sem que meus tios ricos soubessem, fazia de meu refúgio o telhado, embora acordasse lépida, para ir à escola. Entretanto, ninguém me olhava. A quem importava minha expressão infantil cansada. Foi bom, senão maravilhoso, aprendi, até hoje, a falar com as estrelas e outros astros. Pena que hoje, não veja o suficiente. Eu aprendi o valor do silêncio, até na dimensão sideral.
Mas, Deus sempre transforma o nosso viver. Minha mãe casou-se. O meu padrasto perdeu tudo e fomos morar em um “belo” barraco que os “tios ricos” nos legaram, sob indispensável aluguel. Que lugar lindo para mim. Tinha um jardim – só meu – sobre uma pedreira. O mais incrível, naquele pequeno, recanto nasciam as mais belas margaridas e outras espécies de que não sei o nome. Era, meu paraíso, a essa altura com doze anos e sem condições ou roupas para sair. Queria falar delas. A quem? A ninguém. Naquela época, começavam as saias a subir e eu preocupada com o meu jardim. Aprendi outro tipo de silêncio. O das jóias raras que se guardam só no coração. O silêncio do meu lugar. Só os olhos acostumados podem ver esses tesouros, principalmente quando as rosas sedentas bebem a água da chuva.
Não me importava que fosse de madeira. Não me incomodava de passar roupa (com ferro a carvão) até de madrugada para minha mãe e nós não termos dinheiro, pois o marido dela começara a vender pão de porta em porta. Igualmente, não me incomodavam – claro que tinha medo deles – os escorpiões que teimavam em aparecer no meio dos frangos que minha mãe criava. Como não podia pedir apoio a ninguém, jogava álcool neles e os queimava. Sentia-me, tolamente feliz, porque defendera o meu “castelo” de alguns “dragões”. Nem contar podia pelo fato de minha mãe estar sempre ocupada. Este silêncio passou a acompanhar-me. Minhas alegrias eram pueris. Enquanto outras meninas pensavam em seus primeiros namorados. Eu guardava o silêncio do meu jardim.
Mais tarde –muito mais tarde – pude ver a minha mãe em uma grande casa. Eu tinha um excelente emprego e lecionava à noite, enquanto fazia a segunda faculdade. Naquela casa, onde morava com meu filho – já separada – com pouco mais de vinte e cinco anos, havia um belíssimo jardim, Minha mãe tinha a mão de ouro. Todas as manhãs, antes de ir trabalhar ou levar o menino à escola, eu olhava a profusão de rosas, que me davam segurança e levava em meu coração um pouco daquela beleza que alimentava o meu dia, árido de outros sentimentos, mas rico da beleza que eu tanto amava, lado a lado ao sorriso de meu menino. No entanto, mais uma vez aprendi – como aprendi! – o silêncio. Eu não podia falar de mim. Falavam de mim. Eu era a mulher separada do marido. Criava um filho “sem pai”. Uma aberração, por todos os familiares, ruidosos, que, graças a mim, almoçavam e se divertiam. Eu gostava daquela profusão de risos, mesmo que alguns fossem de mim. Esse silêncio amargo doeu muito em minha alma.
Nos caminhos do tempo, vi-me obrigada a sair daquela casa (casas, pois eram várias), pela violência no Rio. Meu filho, há quinze anos, escolheu o apartamento onde agora moro. Animado, alegre, nunca o vi tão feliz. Estava namorando. Minha mãe não queria deixar a casa. Mas , como meu padrasto já partira, mudamos. Por menos de dois anos, desfrutei do sonho que embalara. Minha mãe fica meses sobre uma cama, tetraplégica. Meu filho casa-se, em quatro meses com outra pessoa. Passarinho lindo, com longs e belas asas, que abandonou o ninho por longo tempo, até a separação.
No ano seguinte à partida de minha mãe, perco o emprego que me garantia o padrão de vida (fui demitida por computador, depois de 27 anos e alguns meses). Meu filho, volta sem nada, apenas radicalmente mudado. Recebe o quarto que era de minha mãe e, ali, passa a ser o seu castelo. Falava o essencial. Só. Mesmo com uma nova namorada, por mais de seis anos( menina bonita e meiga), parece que esta casa não era a escolhida por ele. Entregava-se, por inteiro, à família da menina (era a nova família dele), com quem, repentinamente, desfez a relação. Aprendi um silêncio estranho, pesado, dolorido, o da nulidade, ou seja, como se eu não existisse.
Em compensação, aprendi a conhecer cada pedra do caminho da minha rua, das ruas que me levam às escolas, entre lágrimas, pedindo a Deus forças para continuar. Entre problemas variados, como o da visão e o de locomoção, hoje, vivo neste “castelo” feio, porque estão velhos os móveis e precisa de reformas. São 118 metros quadrados de silêncio diário. Ainda tenho algumas belas plantas, mas apesar de amá-las e aos dois companheiros “Pingo” e “Malhado” (esqueci do passarinho cantador), há um silêncio estranho, que pousou nesta casa e dela não quer se afastar. Meu filho, hoje casado, mora bem longe e já tem um lindo filho. Porém, até hoje, não trouxe a esposa aqui. Deve ser tudo muito feio... Ele tem outras metas. Precisa passear com o Noah e a Bia e família que o adotou.
Comigo fica não a queixa, mas a necessidade de meditar para dissipar este estranho companheiro, insuperável, que, noite e dia, me acompanha. Às vezes, logro êxito, o driblo e o esqueço a um canto. Porém, ele retorna diz:
- Não adianta! Habitamos a mesma casa.
Só tem uma coisa: eu não queria que ele fosse tão concreto. Que ele estivesse em cada parede, em cada amanhecer ou ao sol-poente, repetindo que é o meu único companheiro.
Apesar de tudo, apesar da idade, ainda consigo burlá-lo, de vez em quando, abrindo uma janela para a luz.
Portanto, há vários tipos de silêncio e tenho pouco tempo para aprender a conviver com o de agora. Resta a minha fé em Deus.
Bem sei que há outros silêncios, em mundos, que nunca quisera percorrer. Um, contudo, existe, que, em breve, contarei, que é o que sente, eum uma clínica para pessoas que considram depressivas. Principalmente, quando lé está em um quarto com grades.