A NOSSA VIDA DOS OUTROS
Queremos mais que uma vida. Queremos viver várias vidas. Desejamos ser piratas, mouros, cantores famosos, astros do cinema, reis e cavaleiros. Desejamos ser o outro e nunca nós mesmos. Não reparamos no espelho o nosso rosto e deixamos o tempo passar. Deixamos nossas coisas para deslumbrar outra vida, outras vidas. Nos assustamos depois com o que vemos: velhice.
O pior de tudo é quando nos metemos na vida do outro. Somos os donos do conhecimento. Entendemos todos os males e problemas alheios e não sabemos resolver os nossos.
No entanto, possuímos apenas uma única e delicada vida. Se há ou não há aventuras ou tesouros, grandes batalhas ou fantásticos enigmas, não importa. Importa a vida. A nossa.
É cotidiana e tributável e a mesma e a mesma e a mesma continuamente? O que fazer? Somos humanos. Somos falhos. Somos loucos e controversos. Somos o próprio conflito e o próprio caos. E quando amamos tudo piora. Tudo alcança dimensões maiores e mais dramáticas. E morremos sem morrer. E perdemos e ganhamos e continuamos a jogar seja qual for o jogo. E é assim e sempre será. Estamos vivos e este fato, por si só, possui um valor incalculável.
Queremos outras vidas, mas temos uma, uma só para gastar e para amar e para chorar. Não percamos tempo.
O que se há para viver, viva. O que se há para gastar: gaste. O que se há para amar: ame. O que se há para chorar: chore.
Encontre-se e perca-se e deixe-se levar. Aprume-se, endireite-se e siga o que há de significante. Veja ou não veja. Sinta ou não sinta. Escreva ou leia ou faça os dois ou nenhum dos dois. Faça o que é importante para a sua vida.
Queremos mais que uma vida. Queremos viver várias vidas. Queremos viver a vida dos outros. Melhor viver a nossa...