Alegre tristeza

Hoje é o último dia de um ano em que abusei da facilidade de viajar ao exterior. Estive por três vezes fora do Brasil, em 2012. Visitei Madri, na Espanha; quase todo Israel; Roma, na Itália; algumas das principais cidades de Portugal; Praga, na República Theca; Viena, na Áustria; Bratislava, na Eslováquia; Budapeste, na Hungria e, finalmente, Buenos Aires, na Argentina.

Poucos países são tão lindos quanto o nosso. Suas belezas naturais encantam de Norte a Sul. Vinte e dois por cento da flora, dez por cento dos anfíbios e mamíferos e dezessete por cento das aves do mundo inteiro encontram-se no Brasil, que ainda dispõe de quarenta e três por cento dos chamados Paraísos Ecológicos.

A costa litorânea brasileira possui oito mil quilômetros de extensão, com 2045 praias, belas e aconchegantes. Em todos os recantos da amada pátria, a natureza fez papel de madrinha. Concedeu-nos vistas impressionantes e maravilhosas, para serem apreciadas, arquivadas na memória, comentadas com amigos e parentes, e relembradas quando a saudade aperta, passando-as na imaginação como filme inesquecível.

Excetuando-se as exuberantes belezas naturais, o Brasil pouco tem a mostrar. Infelizmente. Os centros históricos de nossas cidades estão decadentes. As esculturas de Aleijadinho, em Congonhas do Campo, deterioram-se sob a ação implacável do tempo, sem a necessária restauração. A arquitetura e a arte barroca de Mariana, Sabará, Ouro Preto, São João Del Rey e Petrópolis, também.

Não existe adequada proteção para salvaguardar a arte brasileira, nem mesmo bom aparato contra incêndio para livrar sua riqueza cultural e artística de eventuais danos. Os prédios tombados pelo Patrimônio Histórico de algumas cidades, como São Luis, no Maranhão, e Ouro Preto, em Minas Gerais, são prova eloquentes do desleixo de nossos administradores. Incêndio em antigo edifício da cidade mineira pôs fim a um pedaço da nossa história. Outro desastre semelhante destruiu a igreja de Pirenópolis, em Goiás. Ali, dois séculos de nosso passado foram consumidos pelo fogo destruidor.

Existem exceções dignas de registro, como Recife, Fortaleza, Salvador e Olinda. A administração pública restaurou prédios antigos, possibilitando aos jovens conhecer a história dos seus antepassados e aos velhos relembrar, saudosos, parte de suas vidas.

Manaus, Curitiba e Rio de Janeiro revitalizaram alguns edifícios e monumentos localizados em centros urbanos decadentes. O Rio limitou-se à melhoria do acesso ao Cristo Redentor; Curitiba o fez em três ou quatro prédios; e Manaus reformou o Teatro Amazonas. Parece ter ficado por aí. Em Maceió e São Luis, apenas para tornar a lista menos extensa, constatamos construções centenárias deterioradas pela ação do tempo, associada ao vandalismo de um povo inculto e desmemoriado. O poder público é o principal vilão dessa história de horror cultural.

A maioria de nossas cidades exibe ruas sujas, calçadas esburacadas, prédios com fachadas cobertas pela fuligem negra da poluição, jardins mal cuidados, praças danificadas, trânsito caótico e ruas invadidas por barracas de camelôs e por pedintes nos sinais de trânsito, em busca de esmolas, quando não para assaltar o cidadão honesto e trabalhador.

Grupos de crianças, nas ruas, consomem crack, à vista de autoridades negligentes e despreparadas. No Rio e Janeiro, outra vez citado, desta feita como referência trágica, em cada cem mil habitantes, quarenta e cinco morrem assassinados. Uma taxa assustadora! Outras cidades brasileiras seguem o ritmo assassino da metrópole carioca. E o que dizer de São Paulo, onde a violência assusta e mata? As estatísticas macabras inibem o fluxo de visitantes.

O Brasil está em trigésimo quarto lugar no ranking mundial do turismo. Registra pouco mais de quatro milhões de turistas por ano. A França recebe 76,5 milhões, a Espanha 49,5 e os Estados Unidos 45,5 milhões de estrangeiros anualmente. Uma diferença e tanto!

Algumas cidades do sul, como Blumenau, em Santa Catarina, Gramado e Canela, em território gaúcho, merecem ser incluídas em roteiro turístico. Não devem ser esquecidas viagens ao pantanal e a selva amazônica, com cuidados preventivos por parte do turista, para não ser surpreendido por naufrágios de barcos superlotados e de rara manutenção.

No tocante à parte cultural, novamente me valho das exceções, para lembrar o pouco a se ver: raros teatros, salvo em São Paulo e Rio de Janeiro; reduzido número de livrarias; pouquíssimos museus – São Paulo é o principal destaque –; muito forró, shows de baixo nível e de alto teor pornográfico no nordeste; excesso de axé e muita batucada em Salvador.

Escrevi parte deste texto há alguns anos, quando da produção do livro "Périplo de um Turista Tupiniquim", registrando viagens a países da Europa e aos Estados Unidos. Na oportunidade, disse, sobre o Brasil turístico, o que repito agora, ou seja: É uma pena!

O título do presente texto, "Alegre tristeza", não é um simples contraste, mas um chamado à reflexão, objetivando concitar o poder público a promover ações que revertam a situação atual de nosso patrimônio turístico. Quem sabe, oportunamente, poderei reescrevê-lo sob o título de "Alegre passado".

LAMERCIO
Enviado por LAMERCIO em 31/12/2012
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