FALTAR É PRECISO

Faltar é Preciso 010.801

De tempos em tempos surgem expressões que se trajam de extraordinária importância e seu emprego, sem que sejam, inteira ou devidamente interpretadas, torna-se extensivo a ponto de serem aplicadas a situações que nada têm em comum com seus significados.

Tome-se a atual expressão qualidade de vida que frequenta as mais diversas abordagens, onde está sempre colocada na condição de objetivo.

Até a racionalização de energia elétrica (outra forte expressão do momento) imprime posições de destaque para a qualidade de vida.

Assim, associou-se esta expressão à imposição da necessidade de disponibilidade de energia para que a luz e todos os dispositivos eletro-eletrônicos continuem funcionando, isto é, não haja privação das comodidades por eles propiciadas, bastando "usar a energia até a meta estabelecida...".

A consequência evitada, na realidade, é outra: não há punição na forma de sobretarifa ou mesmo corte de energia da dita cuja energia! É um resultado conseguido por imposição, circunstância em que, se tal racionalização fosse praticada de forma espontânea, suas vantagens seriam usufruidas em maior plenitude e sem receios ou culpas.

Este caso traz consigo esta indagação: Alcançam-se resultados mais expressivos por vias espontâneas ou por vias restritivas?

Saltemos desta expressão, já tornada usual, para uma citação que também é bastante utilizada, como se fosse um rótulo.

É comum dizer-se que se você faltar ao trabalho corre o sério risco de sua ausência não ser notada, embora no retorno você possa perceber, por si próprio, que há nisso certo tom de verdade se pouca importância você mesmo atribuir ao seu posto.

Este cenário ocupa parte da vida de quem está na condição de empregado e se sente tentado a desprestigiar suas qualificações, seja porque pouco nota o efeito do que realiza, seja porque a remuneração é pequena, seja porque ali é o topo de uma carreira.

Em oposição, existem remunerações elevadas para o desempenho de funções cujo conteúdo estaria muito próximo do vazio e que, mesmo assim, ainda provocam sensações de extrema ocupação e importância.

Os dois cargos, diferentes em vista da quantidade de moeda que os paga, têm um ponto essencial em comum: o valor que o próprio dono da vaga atribui às suas tarefas.

Os dias atuais carregam, para quem queira ter um posto para trabalhar, a imagem repleta de placas com a inscrição "Não há vagas", empurrando qualquer aspiração para debaixo de pesadíssimas pedras.

Tem-se, em resumo, um horizonte confuso em que os valores parecem se distorcer e que os espaços parecem minguar.

Teríamos atingido a saturação e a deseseperança se não fossem a força de vontade e o senso de colaboração, capacidades inarredáveis e inatas que vivem dentro de cada um de nós, com maior ou menor intensidade. É importante contudo reforçar que é por meio dessa força e por meio desse senso que se chega mais rapidamente, ou mais devagar, a um objetivo.

As placas de "Não há vagas" incomodarão, mas até o momento em a oportunidade de trabalho surja, e mesmo que seja um trabalho de voluntariado. Neste, a moeda de pagamento será a eterna gratidão daqueles que foram benficiados, além de nos corações ficarem as marcas indeléveis de ter havido saudáveis, prolongadas e felizes horas para auxiliar o próximo, de maneira desinteressada.

A conclusão a ser atingida não é complicada: expressões e rótulos que se impingem a esmo precisam ser analisados com cuidado e atenção para que não sejam criados imobilismos, a ponto de se imaginar que o fim chegou quando, incontestavelmente, é o instante de reinício que ali se apresenta.

Tito Vernaglia