O controle é nosso
Dia desses, na sala dos professores da FDV, a conversa com colegas seguiu o rumo da constatação do quanto as crianças e adolescentes estão, cada vez mais, influenciados pela TV e pela internet. O foco da questão levantada era a qualidade dos programas de TV (principalmente da aberta) e o conteúdo que atrai os mais novos na rede virtual.
Enquanto a TV e a internet eram colocadas como vilãs por alguns colegas, eu batia na tecla de que ambas são simplesmente o que são: veículos para uma ampla comunicação de massa, como continuam sendo o rádio e os jornais e revistas impressos. O ponto-chave nesse instigante debate é a educação, como sempre foi. Em geral, ela acontece em qualquer cultura a partir de quatro pilares básicos: a família, a religião (ou a falta dela, no caso dos ateus), a escola e a vida em sociedade (entram aí as ações formais advindas do Estado e as informais, proporcionadas pela convivência fora de casa).
É a confluência de tudo o que acontece (ou deixa de acontecer) nesses quatro pilares que faz com que os indivíduos de uma geração sejam existencialmente de um jeito ou de outro. Os que estão na casa dos 40, como eu, vivenciam o auge da mudança de paradigmas na área de comunicação. Minha geração viveu a infância e a adolescência em décadas sem qualquer vestígio da realidade virtual, que, cada vez mais, influencia intensamente as novas gerações. Vivemos um tipo de angústia um tanto desconhecida para os teens deste novo milênio: a falta do contato direto, do abraço, das conversas “ao vivo”. Os livros, filmes, músicas e programas de TV que nos influenciaram de forma decisiva também são outros bem distintos dos que prevalecem nos anos 2000.
Voltando à conversa inicial, o que dá para ser colocado na pauta de qualquer conversa de pais e educadores é que já tem médico recomendando aos seus pacientes o uso intensivo do controle remoto para boa parte das doenças diagnosticadas como de fundo emocional. A recomendação, que tem princípios claros da medicina oriental, é simples e muito eficaz: diante da TV o controle deve representar a censura individual a todo programa que noticie e exalte a violência ou que macule os valores morais e culturais ainda considerados nobres.
É bom que se diga que o controle remoto aqui é bem mais simbólico do que real. Internet e aparelhos audiovisuais também podem ser acionados e controlados por ele. Sendo assim, escolher bons filmes e boas músicas pode ser uma boa opção para os momentos viciosos diante do que pode ser considerado indigesto na TV e na internet.
Algumas vezes tive a grata oportunidade de viajar para lugares sem TV e sem internet e de ficar dias sem notícias do mundo. Posso assegurar que isso tem efeito terapêutico e nos faz ter a certeza de que não precisamos estar antenados com tudo o que acontece ao nosso redor para nos sentir vivos. Ao contrário, morremos um pouco a cada dia em meio à nossa impotência diante da enxurrada de coisas ruins provocadas e sentidas pelo próprio ser humano.
Enquanto nos sentimos impotentes para apenas lastimar os rumos escolhidos por grande parte da humanidade, nossas mentes fazem bem mais do que isso: elas criam tumores, gastrites, aneurismas, depressões, síndromes do pânico, anorexias e outras tantas doenças que possam beber na fonte do nosso lado emocional. Não são a TV e a internet as culpadas disso; somos nós mesmos, que deveríamos ter nas mãos o controle para ligá-las e desligá-las.