PARTES ÍNTIMAS?

PARTES ÍNTIMAS?

Rangel Alves da Costa*

Sem nenhum apelo, mas a verdade é que de vez em quando me ponho a pensar onde ficariam as partes íntimas de muitas pessoas. Indo mais além, me penitencio querendo saber que coisa é essa de parte íntima em quem não tem o mínimo respeito pelo seu corpo, pela sua sexualidade, pelo seu caráter e honradez.

Problema traumatizante, vez que o que mais me indigna é ter surgido recentemente a nova tipificação do crime de estupro ("Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso") e nesta prevê penalização pelo cometimento de crime de estupro àquele que passar, por exemplo, a mão sobre as partes íntimas de outra pessoa.

Assim, para a configuração do estupro basta que uma pessoa (homem ou mulher) obrigue a outra, com violência ou intimidação, a com ela praticar qualquer ato libidinoso, que no caso em comento seria apalpar as partes íntimas. Do mesmo modo, praticar o ato de modo forçado perante a suposta vítima.

A lei também deveria acentuar bem as qualidades e as características da pessoa que poderia ser vítima do crime. E seria preciso porque uma vagabunda qualquer poderia alegar que sicrano ou beltrano causou-lhe constrangimento ao tocar ou apalpar suas partes íntimas. E vagabunda tem partes íntimas que mereçam a imposição de tanto respeito?

Certamente não poderá alegar violação às suas partes íntimas quem expõe sua sexualidade a qualquer moeda; não poderá dizer que foi aviltada em sua honra a pessoa que mostra seios, bunda e genitália como se tais elementos corporais fossem mercadorias; não poderá dizer que foi bulinada aquela que silenciosamente chama o outro para tal.

Não se discute aqui o direito à personalidade e à privacidade de cada um. Verdadeiramente não se pode atentar contra tais princípios da dignidade humana, mas também há que se colocar na balança o valor da dignidade que cada um se impõe. Já diz a máxima que quem não se respeita não pode exigir respeito de ninguém. E digo mais: a honra de cada do indivíduo não está estampada na sua feição nem encoberta nas suas partes íntimas, mas na sua conduta.

Vejo o conceito de partes íntimas pelo aspecto moral da pessoa, e não enquanto localização corporal no indivíduo. Uma pessoa que valoriza sua reputação, que se respeita física e socialmente, que não vive se entregando aos apelos sexuais nem se oferecendo a um e a outro, não faz do seu corpo um comércio, esta sim poderá dizer que possui valiosa intimidade, honradez na privacidade corporal e zelo por suas partes íntimas.

Comumente se diz que as partes íntimas são aquelas estruturas corporais onde estão localizados os órgãos genitais, as nádegas, os seios, enfim, as zonas erógenas. Partes porque fazem parte do corpo, e íntimas porque nelas se escondem as ditas vergonhas, a sexualidade, a erotização e outros valores somente consignados por cada um. Então, nestas partes íntimas residiriam os aspectos moralizantes, castos e personalizantes da sexualidade corporal nas pessoas.

Os dicionários definem íntimo como sendo aquilo que é de dentro, da essência de cada um, do interior das pessoas; a parte mais interna em cada um; o que tem e ao qual se tem uma afeição muito forte; o que é inteiramente privado. Nesta última acepção é que se deve realmente buscar o real entendimento sobre o que sejam partes íntimas.

Foi dito, então, que íntimo é o inteiramente privado, e o privado consistindo no que pertence a cada um, podendo dispor do modo que desejar. Então, a genitália, a nádega e os seios, que são as partes íntimas mais consideradas, seriam de estrutura e conteúdo privativo e sobre as quais somente ao seu dono ou sua dona caberia dispor ou dar destinação. Contudo, como já afirmado, privado à medida que a pessoa se priva da exposição demasiadamente sexualizada, pornográfica, desrespeitosa à moral e aos bons costumes.

Portanto, creio que muita gente há muito que se privou de suas partes íntimas, de sua intimidade sexual, de seu poder atrativo corporal. O que resta no corpo é tão público que até banheiro público é mais privado.

Poeta e cronista

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