CORDIAIS SAUDAÇÕES

CORDIAIS SAUDAÇÕES

Rangel Alves da Costa*

Cordiais saudações.

Talvez você não saiba. A maioria das pessoas também não sabe. Mas preciso dizer que quando digo cordiais saudações estou, triste ou alegremente, falando de coração, com a maior expressividade que possa existir na alma.

Cordiais saudações não significam apenas um termo de saudação ou de despedida. É muito, muito mais que isso. Cordial de cárdio, de coração; cordial, aquilo que expressa sentimentos genuínos, com franqueza e sinceridade.

Noutros tempos, lembro muito bem, colocava cordiais saudações logo no início da cartinha, após o nome do lugar e da data, um pouco mais abaixo, na linha reservada ao primeiro cumprimento, às primeiras palavras com as quais me dirigia a você.

Cordiais saudações. Escrevia cuidadosamente lá, com mão trêmula de saudade, louco para cumprimentá-la numa palavra silenciosa, num beijo, num abraço, num afago, num carinho. E talvez nem precisasse dizer mais nada.

Mas se escrevia os cumprimentos, logo abaixo, com minha letra de forma começava a tecer os melhores sentimentos. Sempre dizia da insuportável saudade, da verdadeira dor da distância, da imensa vontade de estar ao seu lado. E era como eu quisesse entrar na cartinha e dizer tudo pessoalmente.

Algumas linhas após, sempre mais emotivo do que realista, escrevia sobre os melhores planos para nós dois. Aquela realização profissional, a conquista disso ou daquilo, o sonho em comprar um cantinho só nosso, a casinha no maravilhoso silêncio do pé da serra, a certeza da luta para conseguir o melhor.

Lembrava que logo estaria indo ao seu encontro, que assim que desse ia num pé de vento, numa asa de passarinho, num sopro de brisa, em qualquer coisa que fizesse estar ao seu lado. Mas antes de ir estava enviando uma lembrancinha, uma foto da minha janela, um caderno de poesias, uma bijuteria artesanal mais bonita que pudesse existir.

Depois de dizer que o tempo era curto pra escrever tudo que queria, e que ainda assim mil páginas não diriam nem metade sobre tanto amor, começava a me despedir dizendo que desculpasse a letra manchada pela lágrima que caiu. E era verdade. Eu chorava mesmo de saudade. E depois, depois o adeus e o eu te amo e te amarei para sempre.

Mas de repente, não por culpa da folha de papel, da caneta, do envelope, do selo, dos correios nem do carteiro, os cumprimentos passaram a ser de despedida e as saudações foram sendo escritas na parte debaixo da carta, após dizer verdadeiramente tudo, após não ter expressado mais nada de amor. Apenas uma despedida, apenas cordiais saudações.

Houve um tempo que passou a ser um tempo de tristeza, de angústia, de aflição. Minhas cartas possuíam o mesmo conteúdo, diziam sobre todo amor que sentia, e eram verdadeiras em cada letra escrita. Mas as respostas, comecei a sentir, passaram a ser frias, vazias, como se quem estivesse escrevendo cumprisse apenas uma obrigação moral.

E você não tinha obrigação alguma em querer me agradar. Não conseguindo, pois eu lia nas entrelinhas o fim de uma relação que pensei duradoura, acabava por provocar mágoas, sentimentos ruins, tristezas e ressentimentos. Então, logo pensei, por que insistir num amor que agora se faz unilateralmente?

Por isso mesmo evitava escrever como antes, passando um longo tempo sem molhar na língua o selo do envelope. Não havia mais nenhuma razão de ser para forjar sentimentos que sabia não serem mais compartilhados.

E um dia, numa noite de candeeiro sobre a mesa e luar na janela, de copo de vinho e fumaça de cigarro pelo ar, me sentei diante da mesa e escrevi a carta mais longa de minha vida, sem precisar rabiscar mais que duas ou três linhas.

O amor durou a eternidade que merecíamos. Ele morreu e morremos com ele. Que seja feliz. E cordiais saudações. Foi tudo que escrevi.

Poeta e cronista

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