A velhice, quando chega...
Sou do tempo de pessoas recatadas, que raramente se excediam em suas atitudes. Eram, por assim dizer, comedidas. Recatadas, portanto. Poucas alardeavam suas façanhas, por mais impetuosas que fossem. Os gestos mais ousados não exorbitavam do bom senso. Homens e mulheres agiam dessa maneira. Hoje, principalmente as pessoas do sexo masculino, vangloriam-se de performances duvidosas, exagerando-as quando relacionadas à atividade sexual. Com o uso do Viagra, são poucos os homens que não se dizem fogosos entre quatro paredes. Alguns mentem. Muito!
Meu amigo Getúlio, que já dobrou o Cabo da Boa Esperança, conta com mais de sessenta anos de idade. “Cabra da peste” esse Getúlio! Um mineiro porreta, como diria o baiano. Viçoso, graças ao Viagra consumido em suas relações com o belo sexo, é mais um entre os menos recatados. Quando passa uma mulher diante dele, os olhos por pouco não lhe saltam das orbitas. Diferente daquele cara danado, conhecido por “come quieto”. Conversando com amigos, ao passar uma jovem sensualmente vistosa, comenta: Essa aí, eu já, ó! Diz, rindo, enquanto pressiona a mão direita espalmada sobre o ponho esquerdo fechado, num gesto obsceno. Quanta mentira!
Hoje em dia, são muitos os velhos a procura de aventuras amorosas. Alguns se excedem e tornam-se rídiculos. Conheço velhotes frequentando academia de ginástica para fortalecer os músculos flácidos, vestindo-se espalhafatosamente, obedecendo a moda jovem, de péssimo gosto; usam óculos escuros para esconderem as pálpebras caídas e os olhos lacrimosos. Bom número desses velhos, de espírito jovem, como lhes é atribuído o proceder ridículo, deixa crescer os cabelos da lateral esquerda da cabeça, para transpassá-los sobre o cocuruto liso e brilhante. Não são poucos os que tatuam o corpo de pele inelástica e tecido adiposo. Existem, ainda, os que exibem brincos nas orelhas, órgãos da audição, comprometida pelo peso dos anos.
Sempre encontro Getúlio no Shopping Iguatemi, situado no Lago Norte, onde residimos. Às tardes, esse amigo, cujo nome é originário da região da Getúlia, ao Sul da Numídia, ali está bebericando seu chopinho gelado. Bebe bastante, contudo, dispensa os tira-gostos para evitar o aumento de peso, que lhe comprometeria a silhueta cuidada sacrificialmente. Esse é o Getúlio, a quem dispenso a amizade de uma convivência duradoura. Recentemente, encontrei-me com ele. Inspirado, como sempre, falou-me de um cidadão, vizinho seu, conhecido por Dilermando. Eis as informações prestadas naquele momento:
– Certa vez, em gigantesca fila, aguardando atendimento bancário, Dilermando encontrava-se atrás de uma garota bem… Como dizer… Assim… Boazuda…
Getúlio, depois de encontrar o termo certo para qualificar a bela garota, continuou:
– Dilermando olhava a jovem com olhos libidinosos, sorria-lhe, na tentativa de atrair-lhe a atenção. Ele é um velho atrevido, que acha que tudo pode. A moça insinuou-se, como é próprio das mulheres bonitas. Dilermando sentiu a oportunidade de uma conquista. Naquela idade, não dispensaria uma “coisa daquela”, tão revigorante quanto o Viagra que apalpara no bolso esquerdo da blusa, certificando-se, também, da existência do preservativo que jamais deixara de conduzir, nos últimos tempos.
Depois de um gole de chope, Getúlio depositou o copo, quase cheio, na mezinha de tampo de granito. Olhou o conteúdo dourado, com bordas brancas, e não resistiu. Bebeu mais um pouco. A bebida estimulava-lhe a lábia, sabidamente exagerada. Continuando, disse:
– Dilermando mentiu bastante. Contou vantagens, declarou-se bem financeiramente, e até falou à moça de seu passado de atleta que jamais o foi. A jovem trazia consigo uma bolsa que, de repente, despencou de suas mãos. O velhote, esquecido de seus problemas reumáticos e da coluna seriamente avariada, tentou segurar a bolsa que caía, pegando-a na altura dos joelhos da moça. O impetuoso gesto de Dilermando foi o suficiente: esbaldou-se no chão, contorcendo-se de dor. Gemia e peidava. Os gases malcheirosos, expelidos em alta sonoridade, foram acrescentados à urina que encharcara a bermuda. Todo mijado e entrevado, não viu a mocinha sair, às pressas, comprimindo o nariz com os dedos polegar e indicador da mão esquerda.
– É isso o que acontece, Getúlio, com quem vai além da conta – disse-lhe eu, advertindo-o por conhecê-lo já idoso e, ainda, metido a conquistador.
Dias depois, Getúlio me diria:
– Meu caro Lamércio, o acontecido ao Dilermando despertou-me a preocupação. Doravante, quando tentar uma conquista amorosa, serei mais cuidadoso com os gestos bruscos que insinuem falsa robustez física. Basta de alardear sobre os efeitos do Viagra que, desconfio, não tem sido tão eficiente como no passado.
É isso aí, Getúlio. Cuidado!