O legado dos bons

No último domingo (31), em Ervália-MG, pude comprovar mais uma vez como é difícil darmos o último adeus às pessoas queridas. Amiga de longas datas da família da minha esposa e presente em um momento muito especial da minha vida, ao levar ao altar as alianças do meu casamento, Maria Madalena Souza Lima Caetano partiu aos 74 anos, comovendo e entristecendo uma cidade inteira.

A presença de centenas de pessoas na missa de corpo presente e no cortejo para seu sepultamento, assim como as comoventes homenagens prestadas por parentes e amigos, só confirmaram o que pude perceber no pouco tempo em que com ela convivi. Madalena é daqueles seres humanos que fazem diferença neste mundo tão conturbado e perigoso em que vivemos. Todos os depoimentos e comentários sobre ela apontam a sua generosidade e desprendimento para fazer o bem ao próximo. Envolvida com a formação espiritual de crianças e jovens de sua cidade natal, também foi sempre uma presença ativa no socorro a enfermos e mais necessitados.

Estive algumas vezes em sua casa, onde também pude sentir aquela hospitalidade típica dos que são acostumados a acolher o outro com um sorriso largo e de braços abertos. Uma atitude cada vez mais rara nestes tempos de comportamentos egoístas e desconfiados. Médicos e enfermeiros do hospital onde ela ficou internada por quase duas semanas chegaram a comentar o quando estavam admirados com aquela paciente que agradecia a cada intervenção que eles tinham que fazer.

Quando somos obrigados a nos despedir de pessoas como Madalena é que percebemos o quando somos despreparados para a morte. Assim foi para mim nestes últimos oito anos, quando perdi meu pai e meus tios Petrônio e Valda, que ajudaram a construir partes significativas da minha própria caminhada. Sei que isso também é cultural, já que existem povos que tradicionalmente festejam a partida dos entes queridos. Não aprendemos a agir assim.

Cada um lida com a morte da melhor maneira que pode, até porque não há remédio que cure a dor da saudade advinda dela. Ela até se atenua com o tempo, assim como as piores feridas tendem a cicatrizar. No entanto, é mesmo difícil não poder mais abraçar, ouvir a voz, estar fisicamente perto de quem amamos. Por isso esse é um momento de aprendizagem, de amadurecimento, de fortalecimento espiritual. Sepultarmos nossos mortos é, antes de tudo, um exercício de fé; um teste de fogo diante das nossas dúvidas e temores.

Tanto no sepultamento do meu pai quanto no de Madalena (infelizmente, não pude estar no último adeus a tia Valda e a tio Petrônio) tive a oportunidade de sentir a dimensão da minha fé. Nos dois ficou para mim a certeza do que realmente importa nesta vida: o que construímos de positivo para nós mesmos e para os outros. Este é o verdadeiro legado que podemos deixar; o reflexo da mesma riqueza que levaremos conosco.