UMA VOZ À DIREITA
Há certos registros que devem ser recuperados, especialmente no esforço de preservação da memória familiar. O tempo é um carrasco impiedoso e sepulta informações que auxiliam na compreensão do hoje e do amanhã. Gosto de pesquisar no Google, mas há muitos registros e informações não digitalizados. Recentemente, entretanto, encontrei algumas preciosidades da nossa história política e da minha história familiar. Inicio pela nominata dos Deputados Estaduais, titulares e suplentes, eleitos em 07 de outubro de 1962, pelo Partido Social Democrático – PSD, que alerto para que não confundam com o PDS surgido muitos anos depois.
Deputados Estaduais então eleitos, por ordem de votação: Ariosto Jaeger, José Arlindo Kunzler, Gustavo Langsch, Reinaldo Cherubini, Ari da Silva Delgado, Porgínio Borges Pinto, Antônio Fornari, Hed Santos Borges, Alexandre Machado da Silva, José Augusto Amaral de Souza, Euclides Nicolau Kliemann. Os cinco primeiros Suplentes foram: Romeu Roese Scheibe, Alfredo Augusto Barros Hofmeister, Octávio Badui Germano, Adalmiro Bandeira Moura e Darcy Silva Conceição. Ariosto Jaeger, o mais votado, fez 10.785 votos, Darcy Silva Conceição, meu pai, 5.978 votos. O velho teve boa votação para quem custeou toda a campanha com recursos próprios, com bases eleitorais pequenas, como Encantado, Arroio dos Ratos e Itaqui. Acabou convocado e exerceu uns dois anos de mandato parlamentar. Depois, captei no Portal da Assembléia Legislativa do Estado uma entrevista interessante com o ex-deputado e médico José Arnildo Sarturi (Suplente de Deputado Estadual pelo Partido Democrata Cristão - PDC, de 1963 a 1967, que após essa experiência nunca mais quis saber de política). Em seu depoimento à Memória do Parlamento Gaúcho, em 07 de dezembro de 2008, Dr. Sarturi assim se manifestou: “Quando estourou a revolução, em 31 de março de 1964, nós gaúchos estávamos em cima do muro. Ninguém sabia como se manifestar ou quem apoiar, porque o golpe iniciou em Minas Gerais e não tinha se espraiado pelo Brasil. Então estava todo mundo quieto. Eu me recordo, porém, que um dia antes o primeiro a se manifestar na tribuna da Assembléia Legislativa a favor do golpe foi o Deputado Darcy Silva Conceição, que já faleceu.” Bem ou mal, o pai era de assumir posições e de brigar por elas.
Respondendo a outra questão, Dr. Sarturi conta: “Me lembro de Darcy apoiando as Forças Armadas, como a maioria do povo brasileiro também se manifestou a favor do golpe, porque os comunistas queriam o poder.” Naquele tempo, meu pai, na Assembléia Legislativa, era o primeiro a apoiar o golpe e eu, no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, atuava na vanguarda da luta estudantil de esquerda, em favor da Constituição. C’est la vie. Vocês nem imaginam os conflitos domésticos. Meu pai, como boa parte de sua geração, temia a expansão soviética e a comunização do Brasil, já que o exemplo de Cuba assombrava. Tempos de guerra fria. Era, também, contra Getúlio, Jango e Brizola. De peito aberto.
Mas, minha intenção, aqui, é assinalar a descoberta de um valioso depoimento de quem testemunhou os fatos. O velho sempre narrou o episódio indignado com a hesitação de alguns de seus ilustres pares. Ele era assim mesmo, preto no branco: além de visceralmente anticomunista, defendia ardorosamente a bandeira da moral e dos bons costumes, que acreditava em vias de grave desagregação. Se não houvesse morrido em 12 de janeiro de 2001, sofreria demais com o que se vê no país e no mundo nestes tempos pós-modernos. Nem estou trazendo à baila os pavorosos escândalos de corrupção, pois seria, então, capaz de pegar em armas. Era, enfim, bastante conservador, um "reacionário" patriota e bem intencionado. A dinâmica histórica impõe sempre uma reflexão crítica. Na verdade, os pontos cardeais da vida cidadã cambiaram bastante. Pior, o mundo ficou de cabeça para baixo e as muitas crises mostraram que a ideologia tem sido um grande mal ao desenvolvimento das sociedades. O que verdadeiramente importa é ser humanista, com pontos de vista abertos e democráticos. Mas, se defender a moral e os bons costumes for apanágio de indivíduo conservador, quero minha inscrição imediata nesse clube, visto que, com relação aos "mores", o essencial não muda, mesmo com os necessários ajustes e temperos da modernidade. No mais, dá-se um jeito. Ou não, como diria Caetano.