Depoimento: Ontem Eu Fiz 40 Anos
Estão cobrando a minha atenção: acabou a paz, começou a pressão. Imagine você, que nem está lendo estas palavras porque quer – mas o destino, ah, o destino! – entender das coisas que estão no fim desta história sem ter chegado lá! Imaginou? Mas deixe o fim pros finais, falamos agora é de metas.
Quando das minhas faculdades habituais escolares, sonhei muito, produzi pouco na direção desses sonhos, ocorre que de cientista de laboratório passei tão rápido às tablaturas do direito, que faltou juízo: prescrevi logo: ninguém me serviria de exemplo! Não fui juiz, óbvio, nem advocacia estudei. Detesto, inclusive, quase todas as normatizações. Por princípio. Sobre o laboratório, devo apenas dizer que mal pisei em algum, e da química só aprendi as sensações.
Isso mesmo: fui um péssimo aluno mediano.
Daí em diante, tratei de faturar um carisma dali, reter um amparo de lá, fazer os contatos além. Alguns chamam de oportunidade. Quase todos a tratam por possibilidade. A mim, que não costumo atrelar os nomes às coisas, vi-me adiante de cada visto. Dei sorte com a cultura inútil.
Quer saber? Pode duvidar... Mas se você lê estas insidiosas linhas com vaidade de perder a confiança, paragrafe-se! Daqui uns três ou quatro argumentos, mais ou menos, você em pessoa de alma estará uma pessoa disposta a bem-traçar os seus dias de pessoa. É coisa da gente, não tem por mais.
Voltando, agora é minha vez, voltando, ontem tive aula de teatro, num lugar bonito, antigo, trabalhado a artesanato, e com uma turma grande, simpática. Repleta de gente que nunca foi ao teatro. Quanto muito, um stand up comedy. Um amor, as palavras do professor: “ou é stand up, ou é teatro”. Como pode o teatro se encher de gente que não gosta de teatro? Como pode ser tudo isso voluntário? Como pode eu gastar um pedaço da tarde para falar isso e jogar na retina do mundo? Como pode você, que para mim é superior ainda, interessar-se por este escrito?
Num dia uma psicóloga me indicou viver mais a possibilidade cotidiana, e traçar planos sobre ela. Como se uma redação cujo tema era “o que você seria no mundo da fantasia?” encarasse a minha dignidade estipulada. Quem não extravasa numa redação seria digno de alguma preocupação, mas por que a psicologia comum inverte o jogo? Adiante, jogaram tanto na minha cara o sonho do sonhador, que até entrevista de emprego acabava em reprova antes mesmo da minha presença. E quando passei para um salário maior? Quem, entre os meus, recebia o mesmo que o meu? Acontece, noite, manhã, tarde, acontece, labuta, labuta, labuta... Puta trabalho que deu! Cansei...!
Hoje trabalho menos e ganho um terço. Acontece que o chefe me ligou. Quer a minha disciplina para o fim de semana. Ainda não me ofereceu ele nenhum recurso, nenhuma ferramenta, nem treinamento recebi. O que vou falar? A quem me reportarei depois? Atendimento? Operacional? Pesquisa?
Decerto, agora você sabe que lhe cobram sem nem oferecerem as condições para acordar. Saudade dos tempos, de escola, não é?
Você está tão perdido quanto eu estou, isso se não for mais.
Tenho certeza.
O tempo cansa, isso porque a idade mesmo, pra valer, ainda nem veio.
Que vontade de...
Nem sei...!