DIA DE SÃO NUNCA

Prof. Antônio de Oliveira

antonioliveira2011@live.com

Em nome do Jeitinho Brasileiro, o Dia Nacional de São Nunca é observado, o ano inteiro, em todo o território nacional. Sua rigorosa observância está a cargo de pelo menos quatro assessores por titular, nos três poderes e nos três níveis, federal, estadual e municipal, todos muito bem remunerados com o dinheiro público, denominados Todo Mundo, Alguém, Qualquer Um e Ninguém. Qualquer trabalho importante, em benefício do povo, o assessor Todo Mundo tem a certeza de que o assessor chamado Alguém o fará. Qualquer Um, assessor, também poderia e deveria tê-lo feito, mas o assessor Ninguém não o fez, não faz, nem o fará. Alguém se negará a fazer o trabalho porque o trabalho é de Todo Mundo. Todo Mundo acha que Qualquer Um poderia tê-lo realizado, mas Ninguém imagina que Todo Mundo deixará de fazê-lo. No final, Todo Mundo culpa alguém, com inicial minúscula, quando Ninguém deixar de fazer o que Qualquer Um poderia ter feito. Procrastinem-se, “sine die”, tarefas e encargos maiores, prolongando-se sempre a expectativa por meio de promessas. Esse decreto atende a uma herança lusitana identificada pelo próprio escritor Eça de Queirós, n’A ilustre Casa de Ramires, como “procrastinare lusitanum est”, adiar é lusitano.

Na região serrana do Rio de Janeiro, neste início de ano, houve um deslizamento de terra como nunca antes neste país. Lágrimas incontidas foram vertidas nas torrentes, e que não podem secar a consciência nacional com o engodo de que tudo vai bem, tudo já está sob controle, verbas para recuperação serão liberadas, o FGTS de atingidos e o Bolsa família serão antecipados. O prato vazio do flagelado jamais deveria servir de prato cheio para a mídia. A solidariedade maior é aquela que atua preventivamente, e não pode ficar a cargo de Todo Mundo, Alguém, Qualquer Um e Ninguém.

Por isso, como cidadão brasileiro inconformado, abro mão dessa herança maldita que aí está e proponho revogação imediata, em caráter irrevogável, do Dia de São Nunca, com a exoneração dos ditos assessores comprometidos com a omissão e a procrastinação. Uma nova bandeira será hasteada, com o dístico: Prevenir é melhor do que remediar.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 11/02/2011
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