Doutora? Eu? Sim!

Há alguns dias, não escrevo. Falta-me assunto. O respeito aos leitores, embora poucos se aventurem a ler os meus escritos, não me permite ocupar-lhes o precioso tempo com textos mal elaborados, de pouca importância literária ou cultural. Bastam os que já lhes impingi em oportunidades de frágil inspiração como essa.

Sem um tema capaz de motivar o desejo de me expressar através das letras, resolvi compartilhar com o leitor certa mensagem eletrônica, recebida há poucos dias. Trata-se de algo que nos leva a refletir sobre o grande papel da mulher junto à família. Sua dedicação ao árduo e diuturno trabalho doméstico, ao bem estar do esposo, aos cuidados e à educação dos filhos enaltecem os feitos dessa grande heroína.

Diz a mensagem cibernética, que certa mulher, a quem darei o nome de Amélia – para compará-la, sim, à “mulher de verdade”, tão merecidamente enaltecida em versos do poeta-cantor – dirigiu-se ao balcão de uma empresa, a fim de atualizar o seu cadastro. A mocinha que a atendia, diligentemente lhe fez algumas perguntas:

– Qual a sua profissão?

Amélia era uma mulher simples, desprovida de qualquer qualificação constante do Código de Ocupações do Ministério do Trabalho. Não se assemelhava àquela jovem entrevistadora, não era médica, advogada ou professora. Ela pouco estudara, casara-se jovem, concebera quatro filhos, cuidava da casa, do marido e dos meninos. Não sabia como intitular-se. Depois de alguns segundos, respondeu:

– Sou mãe!

A moça disse-lhe que não podia considerar a maternidade como ocupação laboral; por isso, iria classificá-la como “dona de casa”.

Amélia não questionou a insensibilidade da jovem. Não sabia como fazê-lo. Afinal, ela não tinha uma profissão. Era apenas a mãe de quatro filhos que ansiavam por seu retorno ao lar.

– Sim, sou mãe! – concluiu com altivez, ao levantar-se e dirigir-se à porta de saída.

Uma amiga de Amélia, Marta, soube do ocorrido. Dias depois, foi fazer o mesmo cadastro.

– Qual a sua profissão? – indagou um funcionário obeso.

Marta estava preparada. Estudara com antecedência o que diria se lhe fosse feita a mesma pergunta que fizeram à Amélia. Respondeu de pronto:

– Doutora em Desenvolvimento Infantil e Relações Humanas. uma árdua e gratificante ocupação – disse com um sorriso nos lábios.

O moço, depois de fazer as anotações, perguntou-lhe:

– O que a senhora faz, exatamente?

– Desenvolvo um programa de longo prazo, dentro e fora de casa. Sou responsável por uma equipe de quatro pessoas. Trabalho em tempo integral e em regime de dedicação exclusiva, às vezes, de quatorze a vinte e quatro horas diárias.

O funcionário ficou impressionado. Ouviu o que dissera aquela senhora com o mais profundo respeito.

Ao retornar à casa, Marta foi recebida por sua equipe: uma menina de treze anos, uma de sete e outra de três, acompanhadas de um bebê de seis meses. Feliz, abraçou os filhos e deles ouviu suas reinvindicações:

– Mãe, onde está meu sapato?

– Ajude-me com as tarefas da escola!

– Você me busca no colégio?

– Mamãe, compra um celular pra mim…

Sentada em uma poltrona, com os filhos disputando espaço em seu colo, Marta estava orgulhosa do título profissional que se dera:

Doutora em Desenvolvimento Infantil e Relações Humanas.

E ainda pensou: “Como é bom ser especialista na arte de amar!”.