A GOTA D'ÁGUA
José Ribeiro de Oliveira
Estava eu sentado na ribanceira do pequeno rio que quase circunda o meu quintal. A vida, minha e de tantos à margem do seu leito, se confundem com a sua própria vida. Nossas histórias se entrelaçam e são capítulos umas das outras. Já bebi da sua água, já mergulhei no seu leito, já sofri com suas enchentes e já pesquei tanto nas suas águas. Ali sentado, não estava pescando, não estava tomando banho, não estava esperando alguém, pela primeira vez, me pus a contemplar a rotina inalterada do rio, fisicamente inerte, expondo suas entranhas como leito para as águas claras de uma fonte tão distante, deitar e rolar, permanentemente. O Rio, mansamente, insiste em conservar seus contornos, formosear, sinuosamente suas curvas, para embelezar e romantizar, com efeitos insinuantes, em ondas maleáveis, a incessante correnteza. Tudo parece imutável, regular, simplesmente natural. Mas na sonoridade das suas águas, na dança das suas ondas, como no silêncio noturno das matas, vi e ouvi, cair em queda livre e impactante, ecoando musicalmente no silêncio do crepúsculo vespertino, e a seguir, deslizar por sobre a macies d larga e comprida baínha de guariman, e deixando-me extasiado. Ao final do percurso, a coragem lhe faltou para saltar no abismo. E absorvendo lentamente impacto, a humilde folha se refez e o acolhe, até que todo o corpo se moldasse à sua estrutura natural. Serenamente, ainda promoveu um acalanto, sob as ondas do vento, num ritual de animação para amenizar o susto. E sem apego a qualquer canto, vi novamente despregar-se, e num gesto de coragem incomum atirar-se no vácuo. Tão pequenino e imperceptível que quase desapareceu na atmosfera. No seu destino, um imenso círculo se formou para recebê-lo. Milhões saltaram de alegria. Mas, num segundo, deixou de existir individualmente para ser uma corrente. Onde deverá parar? Qual será o seu destino? Por onde já deve ter andado? Por onde já deve ter andado? Onde deverá estar aquela linda Gota D’água?