À saúde de um jovem de hoje

Sou saudável. Sou saudável porque acredito em uma teoria da compensação; ou seja, eu posso me sentir bem por correr trinta minutos no parque e depois me sentar na poltrona com cerveja gelada e amendoinzinho de praxe. Todos os dias, no almoço, eu forro o estômago com bastante capim verde, o qual empurro, junto às arvorezinhas e alguns grãos pequeninos, banhado em azeite de oliva e sal, muito sal. Daí só escolho o essencial, na medida, para render pelo resto do dia sem sentir fome: pouco feijão, arroz integral, frango grelhado, strogonoff de ontem, e uma, só uma bananinha frita, já que as folhas proibem a milanesa da banana de me fazer mal. É verdade que sou orgulhoso e detesto ouvir os que fazem dieta reclamando da abstinência de doces e afins. Sempre renego a sobremesa porque, de fato, sou da turma do salgado. Então, ao invés de sentir na goela um apetitoso e encorpado pavê de chocolate, prefiro servir-me novamente de peixe, e meu corpo agradece pelo banho de saúde. Bem, na realidade o peixe está sempre frito, mas a gordura que o reveste é realmente deliciosa e crocante, do jeito que me agrada; então não resisto, mas como com alface banhada em azeite de oliva, logicamente. Assim, a fritura não faz mal. Talvez o azeite.

O bem-estar após um bom almoço regado a folhas, leguminosas, tubérculos, fibras e água, conforme cantam nutricionistas e mães de nutricionistas, e outras mães comuns, e mães por toda a parte, e não só mães, como, também, pais e tios e, em geral, pessoas mais velhas que louvam a vida correta e sempre dizem “se alimente meu filho, vá viajar mas se alimente direito”, enfim... O bem-estar após um bom almoço só não é melhor do que o charme e poder de acender um precioso e necessário cigarro pós-refeição. Estou certo de que todos os meus esforços alimentares compensam os antes três, agora seis, cigarros que venho fumando há uma semana, visto que há 1 mês passara noites encaloradas debruçado na janela, por causa da abstinência, e há 1 semana decidira voltar a fumar, em menores quantidades, e acredito que posso levar a vida com uma média de cinco ou seis cigarros ao dia, ainda que não seja conforme cantam cardiologistas e pneumologistas e médicos em geral e não apenas médicos como também mães e pais, não só de médicos, mães e pais comuns mesmo, como os seus e os meus, aliás, que já estão divididos, pois que meu pai é o único vivo; é que minha mãe morreu de câncer, nos pulmões; os dois. Ela, coitada, fumava loucamente, dois maços por dia. Por isso, é claro, morreu. Não se cuidava direito. Mas enfim, o certo seria eu voltar a parar de fumar, conforme dizem todas essas pessoas.

Bebo três litros de água por dia, para compensar o trabalho diante do computador; uma vez por mês dou um corridão no parque e encharco as roupas com suor amargo e rejuvenescedor. É importante mover as pernas vez ou outra, já que trabalhar sentado e passar o resto do dia em casa, escrevendo, é um pouco prejudicial para a circulação do sangue; é o que dizem sites na Internet. Também, faz tempo que não me embriago, fruto da resistência adquirida com os anos. Aos fins de semana, deixo-me exagerar; duplico, triplico os consumos, e me satisfaço porque dou risadas, abraço meus amigos e fico feliz. Durmo apenas cinco horas por noite, porque sou forte o bastante para não baixar os olhos no serviço. Hoje, vejo que o segredo da felicidade está, tão-somente, em saber dosar os prazeres da vida. Basicamente, é isso. Sou muito, muito saudável.

Girardello Filho
Enviado por Girardello Filho em 10/01/2011
Reeditado em 12/01/2011
Código do texto: T2721310