MONÓLOGO DO SILÊNCIO

MONÓLOGO DO SILÊNCIO

Rangel Alves da Costa*

Ora, mas o silêncio fala! Todo mundo sabe disso. Ademais, não há indivíduo que já não tenha conversado com o silêncio, nem que tenha sido colocando o dedo indicador sobre os lábios. Silêncio!

E o silêncio possui diversos tipos de vozes, com diferentes usos a depender da situação do diálogo. Por que as pessoas ouvem os mistérios da noite, os sonhos que falam, a voz do vento, a sílaba do medo, a pronúncia do susto, o grito do encantamento, a voz interior?

Se não há boca falando ou expressão inteligível, então tudo pode se expressar através do silêncio. As pessoas conversam com Deus através do silêncio da oração; quando a igreja está silenciosamente em paz os anjos começam a sacudir suas asas e a cantar; o silêncio sepulcral é de morte, mas falou através da lágrima e da dor.

Quanto mais as águas silenciosas mais elas são perigosas; a tristeza e a solidão moram no silêncio e com ele dialogam matizes de angústia e sofrimento, e só há verdadeiramente um grito quando a lágrima começa a cair devagarzinho pelo canto do olho. Dizem que o silêncio da noite é envolvente, às vezes grita, mas geralmente sussurra.

Às vezes o silêncio some, se esconde, vai embora, de modo que sua presença não implique em afirmação silenciosa. Se quem cala consente, então o silêncio acha melhor nem estar na boca fechada, comprometedora. E quando some dá vontade de não aparecer mais só porque a lei insiste em dizer que no silêncio das partes subtende-se o consentimento.

Certa vez um velho eremita - recluso por opção há mais de vinte anos em cima de uma montanha – conversava com o silêncio e perguntou a este o que faria se pudesse ter vontade própria, agir livremente e ir ao encontro de quem escolhesse ou quisesse.

E o silêncio ficou uns dois minutos em silêncio e depois respondeu: Jamais passaria perto de qualquer boca, mas gostaria de estar na mente das pessoas que pensam antes de falar. Certamente dariam mais valor ao silêncio.

E quando foram encontrados alguns escritos deixados pelo velho eremita, em meio a teses filosóficas e preceitos e religiosos encontrava-se um documento que causou particular estranheza aos pesquisadores. Tratava-se de um monólogo do silêncio, grafado com a maestria de quem quer expressar na arquitetura da grafia a nobreza dos sentimentos. E dizia assim tal monólogo:

O silêncio se olhava no espelho e dialogava consigo mesmo, ora perguntando ora respondendo:

Mando a brisa dar o recado a quem eu amo. Não confio na ventania, muito menos em vendaval.

Por isso que as pedras sabem o que querem. São resolutas, confidentes e confiáveis. As tempestades podem mudá-las de lugar, mas não conseguem abrir suas bocas. Toda pedra fala por mim, já que prefiro o silêncio.

Queria ser só silêncio, mas não consigo, sei disso. A natureza vive chorando, as folhas vivem murmurando, o silêncio das águas é quebrado quando se aproxima da margem, até o silêncio do horizonte é quebrado após a tristeza do entardecer.

E por que além do silêncio você não fica mudo.

Ora, não posso porque silenciosamente preciso conversar contigo, que é o único ser que me ouve.

Mas fique em silêncio que vem chegando gente. E parece que é o tempo, parece que é a idade, parece que é a vida.

Poeta e cronista

e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

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