FINADOS

Prof. Antônio de Oliveira*

aoliveira@caed.inf.br

Dias raivosos são dias perdidos na vida. Já se disse que a vida é por demais curta para ser pequena ou curta demais para atos mesquinhos.

Quanto tempo dura uma vida humana? Para uns, em mais largos anos, décadas; para outros, em curtos anos... um riacho que passa pela vida. De qualquer modo, adultos, nem sempre pensamos no que vamos deixar de contribuição ao progresso, ao próximo, à cidadania, ao verdadeiro, ao bom, ao belo: “ars longa, vita brevis”. Benfeitores da humanidade cederam lugar a ícones populares, apenas eventualmente também benfeitores.

Michael Jackson’s this is it é o nome de um documentário póstumo, de 2009, no crepúsculo do astro, feito especialmente para os fãs do king of pop, morto aos 50 anos de idade. Segundo a imprensa, Joe Jackson, pai do ídolo, teria dito que seu filho valia mais, depois da morte, do que em vida, pois o filme arrecadara vinte milhões de dólares no mundo só no primeiro dia, dia do lançamento.

Quanto vale, pois, uma vida humana? E quem lhe bota preço e apreço? A resposta depende do pensar de cada um, de suas crenças e valores, de sua fé, enfim. “O homem sempre desafiou mais seguro a morte – e também a vida – protegido por uma fé que por um escudo de ferro”, diz o filósofo Francisco Romero referindo-se à armadura de D. Quixote. E mais anos de vida não significa necessariamente missão bem cumprida. O que não significa que não devamos desejar muitos anos de vida. Qualidade de vida também é uma obrigação; boa forma, um desiderato. O que é condenável, em si, são os crimes contra a natureza e contra a vida, perpetrados seja direta seja indiretamente, por incúria, omissão, indiferença, imprudência, ódio, vingança, corrupção, todo esse léxico abundante de violência e ambição, de ambição e violência. Assunto de sobra para Tropa de Elite 1, 2, 3...

Morte prematura se diz por analogia com o fruto arrancado à força, ainda verde, no trânsito, nas drogas, na subnutrição, na criminalidade. Cícero legou-nos, já antes de Cristo, o ensaio Da velhice (De senectute), lição ainda para os dias de hoje. Para o autor, tudo o que é feito em conformidade com a natureza deve ser tido como bom. Ora, que coisa é mais natural do que morrer na velhice? Na mocidade, porém, é contra a natureza. Morrer jovem ainda é comparado, por Cícero, ao apagar de uma chama a poder de água; na velhice, é extinguir-se a fogueira por si própria. Já os frutos verdes não se desprendem da árvore sem emprego da força. Os frutos maduros caem por si mesmos. Assim, moços morrem violentamente; aos velhos vai-se a vida pela maturidade.

O certo é que, no Dia de Todos os Finados, ficamos também finados de saudades dos que, na saudade, nos precederam no limiar da transcendência. Lá, al di là, ponto de encontro entre o milagre da vida e o mistério da morte.

Lá, al di là delle stelle...

*Coordenador e Supervisor da Consultoria Acadêmico-Educacional (CAED). Técnico em assuntos educacionais há 30 anos, com experiências no serviço público e na atividade privada. Mestre pela Universidade Gregoriana de Roma. Realizou estágio pedagógico em Sèvres, França. É graduado em Estudos Sociais, Filosofia, Letras, Pedagogia e Teologia. Pesquisador e consultor, presta assessoria, dentre outras instituições, à ABMES, Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior, sendo responsável pela montagem do Anuário de Legislação Atualizada do Ensino Superior. Ministra também cursos de legislação do ensino superior.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 02/11/2010
Reeditado em 02/11/2010
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