DIA NACIONAL DO LIVRO

Prof. Antônio de Oliveira

aoliveira@caed.inf.br

[29.10.2010]

Fazer apologia do livro não é fácil, principalmente quando se faz oficialmente apologia da ignorância, pelo menos da ignorância de livros. E, sobretudo, quando se sabe que, para um político se eleger, gozar de prestígio e mordomias, ou um jogador de futebol faturar milhões, não é preciso escolaridade. Mesmo hoje em dia, o sucesso profissional em determinadas áreas não depende de leitura, embora a pessoa deva saber ler e escrever minimamente. Horácio, numa de suas sátiras, num diálogo com um jurisconsulto notável, chamado Trebácio, lembra que tantos são os indivíduos tantas são as preferências. A ele, particularmente, agradava “fazer versos”. E Horácio faz questão de lembrar, nesse diálogo, o poeta Lucílio que, “quer se sentisse feliz quer estivesse na adversidade, e nunca recorrendo a outro meio, confiava seus sentimentos íntimos a seus livros como a amigos fiéis”.

Certa vez, gozando do status de prefeito reeleito numa cidade bastante próspera, no interior de Minas, um político me desafiou a adivinhar qual a maior glória de sua vida. Como conhecia um pouco da sua trajetória de vida, enumerei alguns itens. Em vão. Aí ele me disse, enfaticamente: – “Você não vai acertar mesmo. A maior glória de minha vida é nunca ter lido um livro.”

Outras vezes se aconselha a leitura aos filhos como se ler fosse uma magia, mas não se dá o exemplo sob a alegação de falta de tempo quando, na realidade, é falta de hábito. Muitas pessoas não teem o hábito de ler um livro. Limitam-se a jornais e revistas.

Não sei se a própria Adélia Prado se lembra disso, mas quando, há anos, um livro dela foi indicado, pela primeira vez, para o vestibular, ela, numa entrevista pela televisão, manifestou-se honrada e valorizada como autora, sem dúvida, mas, ao mesmo tempo, antecipava sua frustração porque sabia, de antemão, que seria lida através de resumos porta-vozes de sua obra.

Na verdade, entre livro e leitura existe um conector. Só que, desligado, não funciona. Exemplo disso é o exemplar da Bíblia aberto sobre um móvel de luxo, e sempre na mesma página empoeirada. Consta que, além de Jeremias, o profeta Ezequiel, de ordem do Senhor, comeu o livro que lhe foi apresentado, e que penetrou em suas entranhas sem lhe ser indigesto. Ao contrário. Livro assimilado, à sua boca refluiu doce como o mel. E ele anunciou a palavra. A mesma metáfora, que hoje seria considerada kafkiana, aparece no Apocalipse de João como dieta para alimentar o espírito.

Na composição musicada “Come-livro”, de Zé Miguel da Trindade, livro se come, e é livre quem come livro. Pois não é que o livro também come, bebe, sabe, canta, anda, pinta, sonha, pensa. E se a gente comesse, bebesse, soubesse, cantasse, andasse, pintasse, sonhasse... pensasse tudo o que o livro pensa!...

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 28/10/2010
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