Primavera e esperança

E eu espero a primavera como esperaria a filha que eu quis e não tive. A minha filha seria loirinha, como meu menino, alegre e cheia de vivacidade. Mas a primavera, essa filha do tempo, das mudanças e dos sonhos, vem me visitar todos os anos. Pontualmente. Amorosa e cheia de sutilezas, ela vai chegando devagar, avisando que é pra fazer festa, música, mais cheiro de doçura e flores e cores e a coragem para mudanças.

E hoje ela chegou molhada, fazendo um tênue barulho nos telhados, acordando, como que aproveitando logo cedo a oportunidade para lavar as mágoas do passado, as frustrações acumuladas ao longo do ano, lavar desgostos, sonhos não realizados, amargura no olhar. E aí não tem jeito: a primavera aproveita para apagar todas as formas de depressão. Nela, tudo se resolve, porque a primavera é a resposta de Deus aos desalentados, aos amargurados, aos solitários e sem brilho. E traz força, vontade do abraço quente e sincero. Vontade de vida. Vontade de iluminação!

Então ontem à noite desejei amorosamente aos meus alunos: “para todos vocês, uma feliz primavera!!!!” Alguns gostaram da idéia. Acharam até interessante alguém pensar nisso. Outros acharam “que babaquice!” Mas não importa. A primavera foi construída para se fazer da felicidade uma abertura de porta da alma para o eterno, a busca do infinito e da pureza.

E me acordei pronta para viver intensamente e fui buscar – como todos os anos – o CD do Strauss – Vozes da Primavera. O dia 22 de setembro tem que começar assim: com Strauss vivo, sangue circulando em todas as veias com pressa para não haver desperdício de vida e felicidade, exalando poesia e musicalidade por todos os cantos da casa . E procuro. E busco em meio a centenas de CDs. São Longuinho, me ajude! Não me deixe demorar! E veio o Tom. Não, Tom, não é você hoje... E veio o Vinícius, o Chico, a Bethânia... mas não é agora que vocês vão cantar, meninos... e veio o Canto Gregoriano, o Pixinguinha, o Adoniran, o Noel e o Palpite infeliz... não, palpite infeliz hoje ... nem pensar... ai meu São Longuinho... achei. E pus o Strauss pra gritar as vozes mais próximas do divino que se tem notícia, exuberante e forte.

Coloquei lá fora o vaso de Leia Verde para ganhar mais força. O pau-brasil vai bem, agora mais robusto e olha pra cima e agradece aos ventos. O pé de manacá explodiu em cheiro doce e cores brancas e roxas no vaso anunciando, de braços abertos, tempo, vida e poesia...

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 22/09/2010
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