REDESCOBRINDO SUZY

Em agosto de 2010, minha filha viajou, com o marido, para os USA e pedi que ela me trouxesse lembrancinha da Rodeo Drive, que é o famoso quarteirão de Beverlly Hills, Condado de Los Angeles, Califórnia, onde circulam artistas e magnatas, enfim, o beautiful people. Não conheço a região e, ao menos nesta encarnação, não alimento interesse maior de fazê-lo. Nada contra, mas não é bem a minha praia. Ela me perguntou, então, se eu não queria mandar nada para Suzy. Fazia tempo que não falava na Suzy, havia esquecido completamente. Quem é Suzy? É minha filha imaginária com a Mulher-Maravilha, ou com a Mulher-Biônica, nem lembro ao certo, que resolvi inventar quando minha filha tinha uns sete anos de idade, só para implicar. Também pretendia criar uma emulação positiva, pois eu a utilizava como referencial de boas atitudes.

Como Paula era um tanto arisca, lá vinha eu a falar de Suzy, com seus belos olhos azuis, comportada e muito carinhosa comigo. Paula não acreditava de verdade, mas o esquema funcionava para aproximar pai e filha, sobretudo quando eu completava a historinha, dizendo-lhe que eu a encontrara numa lata de lixo e resolvera criá-la com muito amor, aqui em Porto Alegre, deixando Suzy viver tranqüilamente com a mãe, nos Estados Unidos. Ela reagia, ficava braba, mas logo se atirava sobre mim com o que ela própria chamava de “atacação de amor”, nos abraçávamos e curtíamos novas brincadeiras. Eu só ficava meio atordoado quando tinha de brincar de “lagucha mama, lagucha papa” e outros joguinhos cantados desse gênero, que ela aprendia todos os dias na escola e me fazia repetir à exaustão.

Mas, não fosse aquela conversa de véspera de viagem, talvez nem mais me lembrasse de Suzy, que tanto cultivei por alguns anos. Ela me trouxe saudades de um quadro de família, com filhos pequenos, dependentes, curiosos, que esquentavam o ninho e preenchiam espaços. Saudades da Feiticeira, da Mulher-Maravilha, da Mulher-Biônica, das Panteras, do Cyborg, do Detetive Columbus, do Kojac, do Magnum, do Cannon, do Starsky and Hutch, do Ultra Man, do Ultra Seven, do Hulk, da Viagem ao Fundo do Mar, da Ilha da Fantasia, do James West e outros tantos da telinha, que reuniam e animavam a família.

Acho que Suzy deve ainda morar em Beverly Hills. Paula não pôde encontrá- la nem nessa nem em outras viagens que fez, mas, tudo bem, eu já a reencontrei. E realmente sinto saudades dela, mas já me esqueci da Mulher-Maravilha e da Mulher-Biônica, coisas puramente de ocasião. Mas filho é filho, mesmo quando fruto da fantasia, e, agora, em 2018, surpreendentemente me bateu uma grande saudade da filha norte-americana que nunca existiu.