A COPA E OS POLÍTICOS PERNAS-DE-PAU

Em pouco tempo, o povo brasileiro estará de novo hipnotizado pelo clima de alegria incondicional que substitui suas dores, decepções e revoltas, de quatro em quatro anos, igualzinho as eleições. Até as eleições malfadadas serão esquecidas, nesses dias. Raiva mesmo; não revolta, mas apenas raiva, apenas quando a seleção brasileira perder algum jogo, e no fim das contas, talvez a copa.

Só depois da festa, a normalidade. Ou a quase normalidade. Comércio e indústria reabertos, o país produzindo o possível, os bancos superlotados e o cidadão encarando longas filas para tirar extratos que revelam o previsível: Nenhuma sobra do possível sucesso dos jogadores alterou sua realidade socioeconômica, abateu o valor de suas dívidas ou diminuiu o preço do antibiótico receitado pelo médico.

Se a seleção brasileira bem classificada ou não, ficar em último lugar ou for campeã, continuarei me deparando com moradores de rua. O país continuará muito bem colocado no campeonato mundial de fome, violência e corrupção. Igualmente, os que vivem da exploração da pobreza continuarão explorando. As máfias do poder em todas as instâncias manterão seus cargos, privilégios e a negação dos direitos fundamentais do cidadão comum. Realidade geral que só poderá ser transformada no dIa em que o povo brasileiro for craque de voto. Souber, ao melhor estilo de um bom técnico de futebol, formar um time político eficiente, capaz e, sobretudo, honesto. Disposto a jogar limpo e ganhar a partida eterna contra todas as formas de miséria e anticidadania.

Uma nova vitória no futebol significará que o Dunga terá sabido escolher seus atletas. Terá sido feliz ao selecionar os legítimos representantes do melhor futebol do mundo. Merecerá os aplausos da pátria, o resultado irrefutável do seu senso crítico, seu olhar avançado e criterioso para reparar falhas, reconhecer as más escolhas e não as repetir. Nestes casos, a segunda chance pode ser fatal.

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Estão continuamente gerindo e representando cidades, estados, e a nação brasileira, sórdidos times políticos que mantemos nos cargos há muitos e muitos anos. Quando nem todos são exatamente as mesmas figuras, os "novos" são similares; têm histórias pregressas publicamente conhecidas. Fichas sujas no cenário político de ponta ou de bastidores. Selecionamos políticos pernas-de-pau, repetimos os erros e damos todas as chances de continuarem nos sacaneando. Essas turmas enriquecem mais e mais, ficam impunes e zombam do país, com seus memoráveis gols contra.

Não nego a grande alegria que terei, se o Brasil for mais uma vez campeão. Torço pelo título, desde já, como qualquer bom brasileiro. Quero também o hexacampeonato. Meu maior sonho, entretanto, é ver o meu país imitar os grandes técnicos de futebol, na escolha de seus representantes e gestores políticos, pois quero que meus filhos, netos e demais gerações herdem tempos melhores.

Até agora, somos realmente um povo bom de bola. Sabemos tudo sobre futebol... Mas cá entre nós; vamos ser ruins de voto, assim, lá no inferno!

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 23/03/2010
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