SORVETE DE CÔCO COM LIMÃO

Ela o deixou em pé, ao lado da cama, quando saiu para nunca mais voltar. Ao se encaminhar para a saída, ela não percebeu que ele a olhou pela última vez com um olhar de ternura e agradecimento. Ficou ouvindo seus passos se afastarem, até que ouviu a porta da sala bater e pouco depois, o barulho do carro dela ir aos poucos se perdendo no horizonte.

Ele apenas ficou ali, parado no meio do quarto, esperando as lágrimas sairem de seus olhos, mas nenhuma lágrima aconteceu. Manteve-se parado, pensando em dizer alguma coisa, mas nada disse.

Minutos depos, resolveu sair, caminhar pelas ruas. O fim da tarde estava lindo, ainda com sol. O céu estava azul, com poucas nuvens brancas. Respirou fundo, fechou os olhos, desceu a rua de sua casa. Pensou em acender um cigarro. Lembrou-se que há de muito parara de fumar. Na verdade, queria ter apenas o que fazer enquanto caminhava sem rumo.

Após tantos anos de convivência em comum, ele não podia imaginar porque ela resolvera jogar tudo para o alto.

Lembrou-se como a conhecera, na primeira vez que a vira, ao chegar para o primeiro dia de serviço no novo emprego. No princípio mal se falavam. Depois aos poucos, foram se aproximando, se conhecendo. Ele, recém saido de um longo relacionamento e ela, muito jovem, experimentando a sensação de querer e se sentir querida. Tanta carícia, tanta paixão. Afogaram-se um no outro em busca da paz que só o amor liberta.

Viveram assim, por alguns anos. Cada um procurava corrigir os defeitos do outro e se não o conseguiam, os procuram absorver. Afinal, defeitos e virtudes são muitos conceituais. Eram felizes, levavam uma vida comum, com brigar e desavenças, com momentos felizes e tristes, com instantes e momentos de amor e paixão.

Mas, tudo acabara! Ele tinha consciência que o fim chegara, mesmo que ela tenha dito que o amava muito, que ele era o companheiro ideal, que a separação seria provisória. Sabia que não adiantaria insistir com ela. Não dava mais para se enganar num relacionamento onde a paixão vinha aos poucos se transformando em posse. E ele não concordava em ser possuído. Somente queria ser amado. Compreendido com seus defeitos (muitos) e suas virtudes (poucas). Ele era assim, sempre fôra assim. Não iria mudar agora...

Pensou que atrás de montanha vem montanha, pois a vida segue, não descansa para chorar. Talvez, algum dia, encontrasse alguem a quem poderia dizer: "eu te amo hoje mais do que amei ontem e muito menos do que vou te amar amanhã."

Continuou andando, assoviando uma música: "... voce foi o maior dos enganos..."

Dobrou a esquina. Parou na sorveteria, pediu um sorvete de côco com limão!

O calor estava demais...