Poema de Domingo
 
Em verdade, este poema não é de domingo, não atende a pedidos, não é porque tenha quem seja apenas quinta-feira, outras terça ou quarta, outras todos os dias, outras eternas noites. Este poema nem a poema está a sair, melhor que seja assim, uma crônica ofende menos que um poema triste.
 
Vou aqui explicar um verso. Atentem-se, explicarei o verso e não como fazer o verso, que isto ninguém explica, se alguém acha que pode, é porque jamais escreveu um. Há também quem diga que o verso, se precisa ser explicado, não precisa ser lido. Concordo e discordo. Outro dia mesmo publiquei um poema – Água e Mato - e já abaixo tasquei a explicação. Está certo, era um concreto, e destes, assim como a arte moderna, se não houver explicação haverá apenas abstração.
 
Tenho aqui maturando um projeto, já tem até nome: da Série Histórias de um Poema. Sim, vou contar como surgiram alguns poemas, abrir a metáfora de alguns versos. Mas são poemas já lidos, já absorvidos, deglutidos, recriados, e assim contar-lhes a história não irá alterar o poema lido. Mas tenho tantos projetos, só de poemas, aqui inspirados, são uns três ou quatro, dependo de minha preguiça se cansar, e eu não querer então descansar.
 
Chega de conversa quase fiada, sim, estou aqui ganhando tempo, não quero falar do que vou falar. O domingo já vai além da tarde, é agora, ou esta dor será somente minha como sempre.
 
Sou apenas o Sol louco que não sabe onde nascer! 
 
Este verso tem seu apelo, surgiu da emoção, da ilusão, da loucura, do pensar com tesão. Ouvi a história de uma figura, das mais lindas que já conheci, sobre quando em visita à cidade de Sengés, nossa primeira vizinha do Paraná, quando se vai por dentro do Ribeira, soube que lá o nascer do sol tinha sua própria magia. Como eu mesmo já havia estado por aqueles vales e cavernas, e presenciado um nascer do sol sem o sol, uma manhã fria, uma imagem de poesia, o vale todo tomado de névoa, como se lá embaixo fosse um mar de nuvens, a história ainda mais me marcou.
 
Acontece que nossa heroína acordou-se ainda na aurora, sentou-se num canto da varanda e esperou, esperou, esperou, o dia clareou e o sol não veio. Quer dizer, não veio do lado que ela estava olhando, porque ele, como faz todos os dias, nasceu pelo oriente, e ela olhova para o lado que via mais bonito – os olhos das moças vêem com mais beleza que o olho do sol, é o que concluo.
 
A graça da história todas já perceberam, eu me coloquei no lugar do sol, que desolado deve ele ter ficado, ao ver aquela moça ali, o esperando, e ele sem nada poder fazer, ter que surgir, autômato, não do lado que se espera, mas daquele que se determina em certas leis do universo.
 
Surgida a oportunidade, o motivo da rosa, como chamo o mote do poema, veio este verso. Brincalhão, imenso, bobo e gentil, era-me uma imagem linda. Hoje, quando olhei lá para os lados que o sol não soube onde nascer, vi que a chuva não deixou de cair, alagou as almas, molhou os corações, matou três pessoas. Sengés esta ilhada, o domingo está triste.

 
Ah, sol louco
sou pouco
ante a dor deste
povo.
Enlouqueça-me também,
onde havia o motivo da rosa
hoje há três coroas,
sem espinhos mas dolorosas.