CREDENCIAL PARA ESCREVER
Prof. Antônio de Oliveira
aoliveira@caed.inf.br
Fama se faz, ou melhor, acontece, realiza-se inopinadamente. E “famosos” são poucos. Quem não é jornalista formado ou escritor famoso parece que não é escritor, que não tem experiência no manejo da pena. Aliás, assim se dizia antigamente. Hoje é manejo do virtual, quem diria?
Modéstia à parte, considero-me com credencial para escrever, e sobre muitas coisas. Pois tenho experiência de muita coisa. Por exemplo, de espirrar.
E como espirro! Portanto, essa experiência é minha, e do meu jeito.
Minha imagem no espelho é só minha. Contemplo-a, todos os dias, há várias décadas. E, para dizer a verdade, não estou enfarado. Gostaria de continuar poder contemplando-a por muitos anos ainda. E é o que muitos me desejam
no dia de meu aniversário natalício.
Já quis ser marinheiro, aviador. Frustrei-me. Mas quanto cronista ou romancista que viaja por aí, pelo mundo afora, mundos reais e imaginários, e também, na sua maioria, não é nem aviador nem marinheiro?
E o povo? Também não fala em tudo, de tudo, em todos e de todos? A escrita não é outra coisa senão letras falantes, letras que falam. E sorriem. E choram também. Letras de forma são como atores, intérpretes, dançarinos. Prestam-se a todos os papéis no palco da vida, nos bastidores, nos cenários do mundo.
Engraçado e triste. Há quem tome banho na chuva, como já tomei. E gostava. Mas há quem não consiga enxugar sequer as lágrimas de vítimas numa inundação que invade como um ladrão, sem pedir licença, barracões de zinco ribeirinhos. E como agora escrevo sobre ambas as situações quando vivi apenas uma delas? E o Haiti, hein?
Não há saberes maiores nem melhores. Há saberes, conhecimentos diferentes, e há pessoas, letradas ou não, escolarizadas ou não, que, petulantes, falam sem deixar ninguém falar. O que há são experiências vividas diferentemente.
Quem nunca, de carro ou a pé, passou por um atalho, errou o caminho e continuou perdido por algum tempo. Também na vida de vez em quando a gente se perde. E que experiência!
Quem nunca chorou ouvindo música sem ser músico? Meu caso. Aliás, sei que tenho muita experiência, ou melhor, muitas experiências mas, até hoje, não sei qual o meu perfil, que continua sendo perfilado sem eu ser um pintor.
Você já teve a experiência de tentar esquecer uma mágoa? E como é difícil!
Pior ainda, parece que esse tipo de experiência entranha no organismo da gente também e só um remédio chamado tempo, feito de experiência manipulada com amor, consegue erradicar também com amor.
Afinal, temos ou não temos experiência, todos nós? Inclusive para escrever...