O VESTIBURLANDO

Aí, meu brother, não quero que pensem que tenho mania de perseguição, não, viu? Mas parece que tem coisas que só acontecem comigo. Volta e meia me deparo com situações como é que se fala mesmo...? “Esdrúxulas”. É isso aí. Conheci essa palavra na sala de espera do dentista lendo um artigo de revista falando de nomes estranhos. Tinha um nome tão esquisito que era chamado disso aí. Vejam só que coisa “esdrúxula” aconteceu comigo:

Sou um cara pra frente, é meu irmão, só penso positivo e estou sempre procurando um jeito de me dar bem na vida, sabe como é? Batalhando, procurando...

A coisa ta russa não, tá é Brasileira mesmo e, se a gente não se virar, fica pra trás, é ou não é? Eu já tô com vinte e poucos anos e não quero que a vida me pegue com as calças na mão. Sou um cara de responsa e que pensa no futuro. Então decidi fazer vestibular pra alguma coisa. Escolhi turismo, porque me amarro nessa onda. Adoro mostrar as coisas nossas pros gringos, principalmente, pras gringas. Já pensou aquelas belas Francesas falando pra mim “Merci bocu”? Seria o maior barato.

Me escrevi, paguei a taxa e no dia da prova me preparei para enfrentar o bicho. Rapaz, me falaram que esse negócio de vestibular era difícil, mas não esperava que fosse tanto. É muita carne pra minha farofa, meu. Mas ainda assim acho que teria me saído bem não fosse o tal do “esdrúxulo”.

Olha só que coisa: Bem na cadeira da frente estava sentada uma gatinha daquelas de tirar o fôlego. Ela estava de costas pra mim, é claro, por isso não dava pra ver seu rosto, também nem precisava. A julgar por aqueles lindos, lisos e longos cabelos negros cobrindo a nuca, omoplatas e lombares, podia imaginar como ele era.

Você deve estar pensando:

-Realmente é tentação algo assim em nossa frente num momento de prova.

Mas não foi só isso não, meu irmão. O negócio é mais embaixo. literalmente falando, cara.

É que o cabelo terminava no começo da... tá me entendendo, né?

E aí a calça dela tava meio folgada naquele lugar e dava pra ver o rego, meu amigo. E que rego! Fiquei doido! O danado ia até lá dentro. Nem a calcinha o cobria, que aliás, era vermelha.Da cor do pecado e perdição.

E lá estava eu, perdido e pecando. Meu sangue começou a ferver, o suorsão a escorrer... Tentava desviar meus olhos, mas não conseguia. Todos os caminhos os levavam ao rego.

Olhei para os lados e para trás, pra vê se alguém também estava ligado, mas nada! Todos estavam cabisbaixos com as caras enterradas no gabarito. Tentei fazer o mesmo, mas quanto mais eu baixava a cabeça, mas ele ficava mas próximo. Sabe de quem falo, né?

Bom, aí pensei: O que faço? Tive a idéia de tocar delicadamente às costas da Eva, digo, da colega à frente e lhe pedir que se compusesse. Mas não achei a idéia boa.

Primeiro porque iria tirar sua concentração. Depois esse meu gesto a deixaria embaraçada e, por fim, o regulamento não permitia que candidatos conversassem entre si.

Aí pensei: Tô enrascado!

Então tive uma outra idéia, que me pareceu ser a solução para meu “esdrúxulo” problema. Pensei chamar o fiscal e lhe mostrar meu drama e o motivo de minha suadeira. Certamente ele se encarregaria de falar com a colega e eu ficaria limpo.

É... mas aí eu não fui nessa não, meu irmão. O que ele pensaria de mim, hein? Claro, meu brother! Pensaria que eu era boiola. Colé, mano, posso parecer muitas coisas, mas isso, nunca!

Esqueci tudo isso e resolvi enfrentar a situação por mim mesmo.

Baixei os olhos o máximo que pude, quase os fechando e tentei me concentrar nas questões. Foi aí que suspeitei que alguém estava de sacanagem comigo. Veja só:

A prova era de Português; O texto a ser interpretado era de autoria de “José Lins do Rego” e o título, era “Riacho doce”. É mole? Dá pra acreditar num troço assim? Eu tentando fugir do dito cujo e as circunstância me levando direto a ele. Era demais para um simples e mortal Cristão.

Mas finalmente meu drama acabou. A colega terminou a prova, se levantou e foi embora. De costas estava, de costas saiu. Até hoje não sei como é seu rosto.

Bem, sem aquele rego me atrapalhando, voltei para aquele outro. Só que quando já estava refeito e concentrado, o fiscal avisa que o tempo acabou e que recolheria as provas.

Entrei em desespero. Ainda faltava a redação e o tempo havia acabado. Aquilo significava que eu tinha perdido o exame. E tudo por que, hein?

Tá vendo aí? Essas coisas acontecem com outras pessoas? Não, mano, só comigo. Só lamentei não ter feito a redação.

De qualquer forma, não sou muito bom nisso mesmo...