Entre o "céu" e o "inferno"

Costumo recorrer ao Dicionário, para confirmar o significado de algumas expressões usadas em meus escritos.

O dicionarista, insigne autor da indispensável obra que tanto socorro proporciona a despretensiosos escritores como eu, define pobreza “como a falta do necessário à vida; penúria; escassez; estado ou qualidade de pobre”.

Pobreza absoluta significa “extrema necessidade do que é vital”.

Quem vive na pobreza é, portanto, pobre, necessitado, paupérrimo, miserável ou indigente, segundo o grau de sua desdita.

Figurativamente, se tivéssemos que situar o rico e o pobre num contexto chamado Brasil, diríamos que o primeiro vive no “paraíso”, enquanto o outro habita as “profundezas do inferno”.

Em nosso país, economicamente e ainda figurativamente falando, o “céu” e o “inferno” se confundem.

Ocupando quase toda a América do Sul, o Brasil possui incomensuráveis riquezas: solo fértil e extensamente agricultável; potencial hídrico e mineral abundantes; o segundo rebanho bovino do mundo; grandes florestas, petróleo (inclusive na camada pré-sal); pedras preciosas e muitos outros recursos minerais e extrativos. É, também, grande produtor agrícola e destacada potência industrial. E, ainda, a sétima ou a oitava economia do mundo, a caminho de galgar posições mais privilegiadas.

Esse colosso abriga cento e noventa milhões de habitantes. Poucos são ricos; muito ricos. Muitos são pobres; demasiadamente pobres. Outros são miseráveis; extremamente miseráveis.

Cerca de doze por cento de nossa população são indigentes, infelizes criaturas condenadas a viver na extrema pobreza, a não conhecer a dignidade humana e a justiça social, cuja ausência humilha e degrada o homem, levando-o às raias do desespero.

Muitos chegam a roubar e até mesmo a matar, motivados por fatores diversos, como a ignorância generalizada que o torna rude, a pouca ou nenhuma escolaridade, a revolta, por sentir-se inferiorizado; enfim, diversas outras origens de cunho social.

Alguns, infelizmente, são de índole criminosa, decorrentes de estados psíquicos ou mesmo por falta de vergonha. A esses, os rigores da lei!

A Justiça comum não parece reconhecê-los. Casos há, em que o cidadão pobre é preso por intervenção policial, acusado às vezes sem provas e mantido encarcerado por tempo superior ao estabelecido em lei. Dias e meses são passados sem que a justiça decida a sua causa. Ao contrário, os ricos e poderosos, quando faltosos, são tratados com ações judiciais que impressionam pela rapidez.

Vinte milhões de brasileiros vivem com renda mensal aviltante, e cerca de cinquenta milhões não conseguem satisfazer suas necessidades básicas, garantido apenas a subsistência.

O governo gasta muito em programas sociais que precisam ser reavaliados para se saber se estão efetivamente dando resultados.

Os programas governamentais, diria melhor, não necessitam apenas de ser avaliados e sim, auditados. Num país corrupto como o nosso, reconhecidamente perdulário, os desvios de verbas poderão ser superiores às aplicações em obras destinadas a mitigar o sofrimento do pobre.

Os muitos reais desviados estariam servindo para melhorar os prazeres dos poucos que habitam o “paraíso brasileiro”, dificultando ainda mais a vida miserável dos moradores desse “inferno social” chamado Brasil.

Dizer que muito já se fez, nos últimos anos, é verdade. Mais poderia estar sendo realizadas políticas sérias e não meramente eleitoreiras.

Não devemos nos satisfazer com o pouco, principalmente se essa porção se destina a elevar o índice de aprovação de administradores escondidos por trás das malhas da corrupção.

Não queremos viver entre o “céu” e o “inferno”, espaço assim denominado para situá-lo no âmbito social. Os extremos separam. Alargam as distâncias. Nosso desiderato continua sendo a união e a igualdade entre os brasileiros.