DIA DE FINADOS

Prof. Antônio de Oliveira*

Costuma-se dizer quando alguém falece definitivamente:

– Eh! chegou a hora...

Hora a que ninguém tem escapado.

Na estrada da vida sempre alguém é, ao longo do caminho,

arrebatado como anjinho, pinçado jovem, colhido maduro em idade avançada, ou acidentado de fatalidade no percurso. Ninguém escapa.

Mesmo assim, mantemos nossa expectativa de vida tendo como referência pessoas mais idosas do que nós.

A expressão chegar a hora tem conotação bíblica e é mais usada

do que chegar a vez. Aliás, vez de que se tem certeza, mas sem aviso prévio do dia e da hora, mesmo em face de uma doença terminal.

Na verdade, se temos, para todas as doenças, um montão de receitas populares, diante da morte não se tem receita, a não ser a receita do silêncio. Receitas de vida pululam nos textos de autoajuda, qualidade de vida, boa forma. Já receitas de morte... A diferença é que, em vida, se pode aviar receita, na morte a receita de vida já vai aviada e arreada na bagagem. Sim, porque tudo indica que o passaporte para essa fronteira entre a vida e a morte são as boas obras. Será que não vamos pagar excesso de bagagem em pensamentos, palavras e ações de mesquinhez, ódios e vinganças, ou esquecer para trás, distraidamente,

o bem que deixamos de praticar por insensibilidade e falta de desprendimento? Fama, dinheiro, muamba enfim, mando, luxúria desenfreada, prazer a todo o custo, são produtos vedados que temos

de deixar para trás. Não passam por essa alfândega. O mundo seria

um paraíso terrestre se a morte tivesse o condão de funcionar como advertência. Óculos escuros simulam presença solidária, nos velórios, e o mundo não aprende, ante o arremate da morte, a maior lição de vida.

Segundo Cecília Meireles, “só os poetas, entre os humanos, sabem que uma deusa [a primavera] chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, vem dançar neste mundo cálido de incessante luz...” Na morte, essa deusa atende pelo nome de sensatez, consciência limpa, primavera eterna, “com as matas intactas, as árvores [do paraíso] cobertas de folhas”, coroas de flores que não murcham jamais. Brás Cubas, de Machado de Assis, diz com desdém, “já não há vizinhos, nem amigos, nem inimigos, nem conhecidos, nem estranhos; não há platéia. O olhar da opinião, esse olhar agudo e judicial, perde a virtude, logo que pisamos o território da morte...” no Lado-de-Lá, além, là sù... al di là delle stelle...

*Coordenador e Supervisor da Consultoria Acadêmico-Educacional (CAED). Técnico em assuntos educacionais há 30 anos, com experiências no serviço público e na atividade privada. Mestre pela Universidade Gregoriana de Roma. Realizou estágio pedagógico em Sèvres, França. É graduado em Estudos Sociais, Filosofia, Letras, Pedagogia e Teologia. Pesquisador e consultor, presta assessoria, dentre outras instituições, à ABMES, Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior, sendo responsável pela montagem do Anuário de Legislação Atualizada do Ensino Superior. Ministra também cursos de legislação do ensino superior.

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fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 28/10/2009
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