Crônicas de Sala de Aula: O grito da Independência
Hoje o dia começou absurdamente absurdo, não é que em Curitiba não amanheceu chovendo...
Não tive as duas primeiras aulas, isto significa que Orfeu me recebeu algum tempo a mais, mentira, acordei cedinho e tive a infeliz idéia de ligar a tv para ver o jornal...
Só um sequência de desgraças, trapaças, nada mais natural neste mundo irreal.
Desliguei a tv e liguei o rádio enquanto me arrumava para sair, então ouvi Legião Urbana, Titãs, The Cure, Super Tramp, estava rolando um especial só de clássicos dos anos oitenta, nessa época onde vivi minha adolescência, a mesma idade dos alunos que hoje leciono.
Cheguei na escola, fui digitar provas sobre os governos populares, ditadura essas coisas.
Pela manhã os temas de minhas aulas foram estes, á tarde, O Grito de Independência...
Então analisei com meus alunos as telas pintadas por artistas europeus retratando o fato histórico.
D. Pedro I, empunhando sua espada, cercado por nobres cavaleiros, que bela cena!
Seria se fosse a realidade, todos sabem que o ilustre estava com uma baita dor de barriga, ou quase todos..
Em nossa sociedade as coisas acontecem de uma forma e são retradas de outra, nada mais normal, mascarar a realidade.
A verdade é que todos estão sujeitos a mal estares, mas refleti com meus alunos e alunas, imaginem, vocês terem que tomar uma decisão importante estando com um mal estar terrível, bem o fato é que talvez isto explique a situação em que o Brasil vive mergulhado..
Uma independência encenada, o poder apenas mudando de uns interesses para outros, e tudo isso em meio a uma dor de barriga.
Claro que não podemos ser pessimistas, mas falo com convicção aos meus alunos e alunas que só será possível mudar se nos apercebermos de nossa história.
Nossos jovens não são desinteressados, apenas se interessam quando encontram alguém que desperte aquela fagulha, e sem falsa modéstia isto eu faço em minhas aulas.
Relato episódios do cotidiano para despertar algo a mais, se não dá resultado com todos, muito bem, mas tem sempre aquele que fica até depois de bater o sinal para te contar algo que leu, o filme que viu, isto ilumina a fagulha em nós que estamos no papel de "transmissores do conhecimento".
Somos uma praga?
Talvez, mas somente para os acomodados, alienados, aqueles professores e pedagogos arcaicos que não conseguem vislumbrar nada além das notas no final de cada bimestre, resultados...
Hoje por incrível que pareça fui inquirida do motivo de meus alunos de uma sétima série terem escolhido a temática sexual para a feira cultural, coisas do tipo, doenças sexualmente transmissíveis, gravidez, etc e etc..
Nossa, qual o problema dos alunos escolherem este tema?
Acreditem um dos grupos foi vetado o tema, eles tinham escolhido "impotência sexual", foram proibidos de abordar tal tema.
Ora me poupem desta hiprocria, como se o sexo e os problemas referentes ao mesmo não existissem, tudo ilusão.
O tema deste grupo foi modificado para "higiene pessoal", este é o problema, imposição, como estes alunos farão um trabalho legal sendo obrigados a falar sobre "higiene pessoal", alunos de sétima série, que estão com os hormônios em ebulição.
Isso aqui tá é parecendo ditadura militar, só o que falta é voltar a velha "educação moral e cívica.
Higiene pessoal precisam é estas pessoas que insistem em modelar a tudo e a todos, padrão tudo é padrão.
É eu deveria me adequar aos moldes, mas não consigo, ainda bem que não fui militante no período da ditadura militar, senão com certeza estaria entre a lista de desaparecidos.
Ainda bem que escrevo, pois é neste momento sagrado que realizo meu desabafo, afinal sabemos que com certas pessoas não vale á pena sequer tentar argumentar, apenas damos um sorrisinho amarelo e nada mais...
E se por acaso deixar de publicar aqui no recanto, procurem por mim, nunca se sabe quando coisas abomináveis irão retornar...
Somente mais uma coisa, é por tudo isto que amo José Saramago, eita homem porreta, que o diga sua mais recente obra "Caim"!