QUANDO O DESTINÁRIO ESTÁ OCULTO

QUANDO O DESTINATÁRIO ESTÁ OCULTO

100.101

Engendram-se palavras para definição exata,

norteadas por agulhas magnéticas de ação espontânea,

gerando rumo às idéias engenhosas – força inata! -:

Então está criada u’a recente fábula contemporânea,

na qual a engenhosidade de cada expoente humano

historia momentos antes não descritos por inércia

absurdamente incognoscível ao perímetro mundano ...

Rotas retilíneas estendem-se agora à figura controversa,

inventada pelo porta-voz das flores, guindando-a ao pedestal

arquitetado para suportar o peso imaginário de um Ideal !

As urbes comunicam que os mensageiros tradicionais e modernos continuam transitando por suas paisagens e também nelas erguem seus espaços de ação.

Em saudável exercício físico diário, a uma velocidade média de 5 km/h, em 4 horas o carteiro caminha 20 km no cumprimento de seu dever de distribuir cartas e outras correspondências, que têm destinatários completamente identificados nos respectivos envelopes ou invólucros além de os remetentes terem feito idêntica identificação nos seus versos.

As bancas expõem revistas e jornais, às vezes até livros, que os clientes adquirem a seus gostos e critérios. Escrita ou memorizada, a lista de assinantes orienta o jornaleiro, que pedala sua bicicleta, para entregar cada exemplar do jornal.

Em cidades maiores, o moto-boy cumpre sua missão similar, entregando inclusive talões de cheque, outros valores e encomendas: para ser mais rápido, usa rodas motorizadas em vez de pés calçados ou que pedalam; adolescentes incumbem-se de entregar, de casa em casa, ou em pontos estratégicos, folhetos que veiculam mensagens publicitárias.

Com organização visual bem vistosa, as estantes de livrarias exibem as capas dos livros, alguns até lacrados para evitar que sejam folheados, onde leitores buscam novas idéias, inventos, conceitos, descobertas, histórias, imagens, sugestões ou, raramente, raridades – Metodologias para Desenvolvimento Urbano, Ciências da Pirâmide....

Em resumo, sempre uma mensagem escrita, em formatos diversificados, segue de alguém para alguém.

Está fora de questão que emitir e receber mensagens não significa comunicar-se. Segue-se que, sendo o homem um ser social, que vive e convive com seus semelhantes, comunicar-se faz parte de suas atividades essenciais de vida, tanto que possui, como dons naturais, cinco (seis) órgãos de sentido.

O verdadeiro destinatário da mensagem pode representar a dúvida crucial para quem a elabora, em se tratando de uma mensagem escrita cujo destinatário não está explicitado, como o está numa carta. Disto encontra-se esclarecedor exemplo na figura do escritor profissional: - Quem são seus leitores?

Bem, confirma-se como primeiro leitor o próprio autor, que lê e relê seu trabalho para certificar-se de todos os detalhes e extensões que pretende passar adiante.

Se o texto fosse direcionado apenas ao próprio autor, as releituras já fechariam a lista de leitores, ratificando a intenção exclusiva de registrar uma seqüência de idéias, nada mais.

Em caso contrário, a lista prossegue com todos aqueles que se identificam com as idéias, enredos e conceitos propostos, valendo também a admiração à escola e ao estilo do escritor.

Curiosos, amantes incondicionais da leitura de qualquer gênero e até mesmo adversários do escritor são outras pessoas que lerão, linha por linha, a mensagem do profissional das palavras.

É preciso salientar que o aproveitamento colhido da leitura representa um outro campo de ação, intimamente ligado aos enfoques que cada qual dirige àquilo que lê.

Retirando-se o caráter profissional, resta o escritor, aquele que escreve, não mais com o objetivo de exercer sua profissão, mas com outros propósitos que vão desde o gosto puro pelo simples escrever até o tom professoral conferido ao escrever já não tão simples.

Então, coisas de amador, concluirá o mais afobado. Se isto for levado pelo lado pejorativo ou jocoso, à mensagem pouco valor se lhe atribuirá, em conseqüência. Embora bem articulado, com início, meio e fim, os efeitos que o texto amador possa atingir serão de muito menor significação, a ponto de dar espaço à incômoda indagação: - Para quê serve esse treco?

Aqui o autor amador atingiu sua meta básica de conseguir que o leitor faça ao menos uma pergunta a respeito do que acabou de passar diante de seus olhos.

A resposta vem de mais questões que, eventualmente, continue fazendo ou, por outra via, de idéias que troque com pessoa diferente que também tenha lido o mesmo texto.

A indagação que classifica o texto de treco apresenta oportunidade de ser substituída por uma outra, que vai à origem: - Por quê o autor escreve sobre esses assuntos, que não são corriqueiros, como se quisesse inculcar algo ao processo de leitura?

Certamente é essa a intenção do autor, ficando a interpretação do algo a cargo de quem comete a leitura.

Um texto guarda semelhança com uma viagem, que começa, continua e entrega os passageiros ao seu destino. E, lá chegando, cada um deles ruma a lugares distintos, mesmo que sejam quartos de um hotel, no caso de uma viagem turística. Cada quarto, tendo características próprias, influirá na melhor ou menor acomodação reservada a cada hóspede que, se não estiver satisfeito, providenciará junto a gerência do hotel a troca de aposentos, transferindo-se para um outro que mais o agrade. São, voltando à questão de interpretação, mudanças de entendimento conforme a maior ou menor proximidade com as palavras e idéias escritas.

Posto que, embora fixas, as palavras não são estanques, a mensagem de linha unitária pode ter o peso de um livro enquanto que 404 páginas podem traduzir-se em uma única linha. Trata-se dos poderes da análise e da síntese que produzem um tipo de conclusão que talvez não tenha a menor correlação ou talvez tenha a mais perfeita correlação com a idéia e o objetivo originais. De qualquer maneira, o processo é bi-unívoco, indo do autor ao leitor e vice-versa, onde este último insere mais um elo na corrente de destinatários não tão ocultos. E, por primeiro, jamais ignorando que a corrente se engrossa na medida em que, com clareza objetiva, o juntador de palavras (se) expõe, colhem-se os frutos insólitos das árvores plantadas além das barreiras do desconhecido – coisa maior que achar a agulha no palheiro!