Cheio de “Bêia”!

Cheio de “Bêia”!

Enquanto crianças, moramos em casa de quintal, este naturalmente transformado em pomar, pois meu pai, amigo da natureza, sempre plantou árvores frutíferas, aproveitando bem o espaço. Além de apreciar as colméias nunca deixou faltar à família o mel puro e gostoso. Papai criava as abelhas europeias que eram mansas. Brincávamos perto das casinhas numa cordial amizade. Com a chegada das abelhas africanas, mais produtivas, embora agressivas, misturaram-se as raças. A partir daí, não podíamos nos aproximar das colmeias, ao menos falar alto, que as abelhas se estressavam.

O tempo passou e me surpreendi mãe de três garotões. O Rodrigo já de doze anos e o Lúcio de onze. O caçula, Sávio, com cinco anos. Tendo resolvido passar o dia com meus pais, coloquei-os num fusca velho e fomos curtir “a casa de vovó”, que ficava num beco sem saída, perto da Catedral.

Mal chegamos, a criançada inicia o corre-corre. Pique de esconder! Escondem daqui, gritam dali, quando o Lúcio, passando perto da colmeia, desatinado, resolve fazer uma travessura. Joga uma pedra na casinha interessante. Num átimo, as abelhas, armadas até os dentes, saíram enfurecidas atacando todo ser vivo que encontravam. As galinhas foram as primeiras vítimas. As pessoas fecharam-se em casa. O cachorro da vizinha amarrado e indefeso, não escapou. Parecia que estávamos num inferno. Não tínhamos como acudir as galinhas que estavam com as cabeças pretas de tanta abelha. Mais de 30 morreram. Ninguém podia entrar no beco que levava boas ferroadas. Todos fomos picados. Embrulhados em lençóis, resolvi levar as crianças para casa com medo de que passassem mal com o veneno das abelhas. Conseguimos entrar no fusca. Estávamos saindo, eis que surge correndo o Walmir, da idade do Sávio, todo desprotegido, seguido por uma multidão de abelhas. Queria entrar no carro também. Mas ele morava ali mesmo em frente. Então gritamos para ele correr e entrar em casa.

Quando foi à tarde, voltei à minha mãe para ver se a situação normalizara, não levando as crianças, que estavam traumatizadas. Graças a Deus, as abelhas se acalmaram, voltando para a colmeia. Meu pai ficou tão desgostoso que nunca mais criou abelhas. Meus irmãos levaram-nas para a roça, onde estão até hoje.

Porém, de volta a casa, o Sávio, o menor, esperava-me no portão, todo apreensivo:

— “Mãe, o "Warmi" morreu?”

Respondi e perguntei: “Não, por quê?” Torna o Sávio:

— “Ele tava cheio de bêia!”

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 04/06/2006
Reeditado em 31/07/2012
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