"A BELEZA DAS PUTAS"

Meu pai era pessoa rigorosa quanto à moral e aos bons costumes; homem conservador, lá da fronteira (do Itaqui), não se cansava de pregar contra a dissolução dos valores tradicionais da família e da sociedade.

Por vários anos, com ele, minha mãe, uma irmã e um irmão menor, morava ainda um outro irmão, então na faixa dos vinte poucos anos - hoje circunspecto pai de família e profissional dedicado. Esse irmão apreciava, de quando em vez, retirar nas locadoras de vídeo aqueles chamados filmes adultos, tipo "A virgem e o pônei", "Viciados em c ", "69 em pé" e outros que tais. Normal para homem solteiro e jovem, especialmente naqueles dias frios, chuvosos e sem programa. Quem não o fez, que atire a primeira pedra. Pois bem, estava ele certo dia no banheiro da residência apreciando o jornal, onde socava e escondia os instrutivos folhetos de propaganda dos filmes distribuídos pela locadora, quando foi chamado urgentemente para alguma tarefa profissional. Esqueceu completamente dentro do periódico os encartes de filmes adultos que estivera a consultar. Meu velho pai, a seguir, no seu turno de frequentar a "casinha", apanhou o jornal para a leitura diária e, lá pelas tantas, deu-se de cara com aquele monte de sacanagem. Teve um choque, chamou minha mãe e começou a esbravejar contra a libertinagem, agora encampada e difundida pela grande imprensa. Irado, cheio de razão, telefonou para a redação do jornal e disse que, como assinante e defensor da moral, não aceitava aquele tipo de propaganda desavergonhada. A redação ficou perplexa, negou, argumentou, mas prometeu averiguar. Só bem depois, a família concluiu que se tratava de obra de meu irmão incauto. Meu pai, muito constrangido, voltou a ligar ao jornal e desculpou-se com alguma historinha mal enjambrada.

Ainda lembro de uma das críticas do panfleto sobre um daqueles escaldantes lançamentos cinematográficos : " O filme é péssimo, mas vale pela beleza das putas".