UM OLHAR

Tenho pensado na Internet sob certos ângulos negativos com relação ao adolescente, mas, em face da realidade tão adversa, talvez seja mesmo um caminho seguro ao aprendizado, à comunicação e ao lazer sadios. Penso também na vida pré-rede, pré-celular, pré-DVD e creio que agora está melhor. Não muito melhor, só melhor. Perdeu-se um pouco de convívio familiar e social, mas nada que não se supra com alguma determinação. A comunicação à distância aumentou barbaramente; talvez tenha diminuído dentro dos lares.

Sou de um tempo em que a namorada ia veranear no litoral, o rapaz ficava trabalhando na cidade e, em alguns casos, encontravam-se ao final das férias ou depois de 15, 20 dias, porque não eram todos que podiam desfrutar de casa de veraneio ou de folguedos à beira-mar. As estradas eram péssimas e as distâncias maiores. O intercâmbio romântico dava-se por carta manuscrita, com longas páginas de saudade derramada.

Sou da era da carta, do telegrama, do fonograma, dos versos românticos que curtiam a fossa. Tempos criativos e trabalhosos.

As noites frias e chuvosas ganharam esplendor com a Internet para todas as idades e recantos do mundo. Tudo mais cômodo, ainda que menos poético - numa visão tradicional.

Infelizmente, não são muitos os que cultivam poesia; mas há lirismo na modernidade.

Vejam, em outubro de 2003, numa noite de ficar em casa, andarilhava eu por “chats” de conversação na web, até desembocar no do Portal Terra. Lá, deparei com um nickname atraente: “Raíssa33”. Sim, há nomes atraentes. Ademais, 33 também me pareceu um belo número para idade. Eu era, então, “Um Olhar”: tinha 56 anos, mas achava bonito dizer 55. Após apresentações e conversa mole (como numa danceteria ou supermercado), navegamos para o espaço reservado do chat; depois de horas de papo virtual descontraído, um telefonema na madrugada e – surpresa! – “Raíssa33” morava a trezentos metros de minha casa. Descobrimos muitas afinidades, mas confesso que o vis-à-vis foi decisivo. Encontro marcado: fosse feia, restaurante B, bonita, restaurante A.

A partir do restaurante A, a relação fluiu naturalmente, com final feliz: amor à primeira teclada, disse um amigo.

José Pedro Mattos Conceição
Enviado por José Pedro Mattos Conceição em 19/05/2009
Reeditado em 09/07/2011
Código do texto: T1603278