GUERRA DE MENINOS

A proposta da mudança veio de Pedro. Ele estava ofegante, mas ainda queria brincar. Só queria variar um pouco o tipo de brincadeira.

- De polícia e ladrão! - Gritou um gaiato.

Todos toparam. Brincadeira excitante, aquela. Excitante e atual, embora os meninos nem soubessem o significado desse último detalhe, no tocante ao momento.

A pausa para escolher quem seria quem foi demorada. Todos queriam ser os bandidos, alguns até aceitaram ser os trabalhadores (figuras de alguma importância nos cenários de batidas policiais em comunidades pobres), mas ninguém queria ser polícia.

Depois de muita polêmica, surgiu o consenso: Resolveriam no "cara ou coroa" quem seria quem. Entre satisfeitos, resignados e enfurecidos, todos tomaram seus destinos na brincadeira e partiram para o desempenho dos papéis.

"Batalha" ferrenha. Bandidos e polícia se enfrentavam numa peleja sem trégua. Trabalhadores corriam de um lado para outro, sem amparo. Havia enorme desespero no cenário encampado pela molecada. No faz-de-conta, o campo de batalha era um velho campo de futebol. Uma favela de barracos invisíveis.

Não demorou muito, e as mães chamaram seus filhos para o almoço. Como não queriam deixar nada para depois, as crianças resolveram redicalizar, finalizando logo aquela história como acharam adequado à vida real.

Em um lance de muita sorte, os bandidos conseguiram matar numa só tocaia, todos os policiais. Feito isto, fugiram. Foram às pressas, atender ao chamado de suas mães e do ronco de seus estômagos, porque matar policial dá muita fome.

Mas ninguém se condoa com os policiais mortos nessa guerra, porque antes eles fizeram algo bastante comum, que lhes serviu de consolo antecipado: Mataram todos os trabalhadores.

Não tenham pena também dos trabalhadores: Tendo morrido logo, eles acabaram se dando bem... Foram almoçar mais cedo.

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 18/05/2009
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