A beleza de Susan Boyle
Em meio a enxurradas de notícias trágicas, fofocas sobre a vida de artistas e anúncios de beldades em ensaios sensuais, o mundo foi surpreendido pela voz de uma anônima. Mais do que anônima, a escocesa Susan Boyle, de 47 anos, chegou ao reality show mais famoso da TV britânica – o “Britain's Got Talent” – como uma espécie de patinho feio, de zero à esquerda.
O programa, exibido no dia 11 último, foi visto por milhões de pessoas em todo o mundo. Um número gigantesco de testemunhas para as expressões dos jurados e da platéia assim que aquela senhora simples, completamente fora dos padrões de beleza vigentes, surgiu diante das câmeras. Era quase como se a sua presença ali fosse um equívoco, uma pegadinha, um erro da produção.
Bastou, no entanto, aquela moradora de uma pequena aldeia da Escócia abrir a boca para surpreender a todos com a sua verdadeira essência. Cantando "I Dreamed a Dream", do musical “Os Miseráveis”, ela emocionou jurados, platéia, telespectadores e, nos dias seguintes, internautas dos quatro cantos do planeta (o vídeo de sua apresentação já teve cerca de cem milhões de acesso na rede!).
Susan Boyle virou uma celebridade-relâmpago, já tendo recebido, inclusive, propostas para gravar CD, para participar de um filme hollywoodiano, para centenas de entrevistas e até o descabido convite para protagonizar um filme pornográfico (uma ironia vulgar e de péssimo gosto à sua declaração de que até hoje nunca beijou um homem). Mas não é da ascensão meteórica (e talvez fugidia) desta escocesa que gostaria de falar, e sim da verdade e da pureza que ela conseguiu passar com sua voz.
Enquanto a indústria estética fatura bilhões de dólares com silicone, botox e cirurgias plásticas, respondendo a uma adequação de homens e mulheres ao padrão de beleza ditado pela moda e pela mídia, pouco se busca o que seja essencial ao espírito. Quantos artistas de talento morrem no anonimato, enquanto participantes de programas na linha Big Brother recebem contratos milionários para tirar a roupa em revistas masculinas?
Agora foi diferente; o mundo se rendeu à beleza de Susan Boyle. Não a do seu corpo e rosto, pois certamente a maioria dos que se surpreenderam com sua voz sequer a notaria na rua. O mundo se rendeu à própria evidência do que realmente tem significado nesta existência. Algo como se emocionar no mundo da ficção com as histórias da Bela e a Fera, do Corcunda de Notre-Dame e de Shrek.
Assim que tive acesso ao vídeo da apresentação de Susan Boyle me senti “vingado”. Mais ainda quando li inúmeras notícias sobre a repercussão mundial dele. Sei que este não é um sentimento digno de alguém cultivar (muito menos citar num artigo assinado). Mas a senti, pois imaginei o que deve ter passado pela cabeça de milhares de pessoas que vivem com um pé na futilidade e o outro na superficialidade. Talvez possam ter dito (ou pensado): “por que tantos holofotes para essa mulher feia e desajeitada?”
Na música “Lenda do Pégaso”, de Jorge Mautner e Moraes Moreira, o passarinho feio queria ser todas as outras aves porque não aceitava a si próprio. No final Deus o fez ver que a sua verdadeira beleza interior tinha a dimensão do Pégaso, o lendário cavalo-alado.