MEMÓRIAS

Tenho publicado no Recanto das Letras alguns trechos autobiográficos no intuito de repassar informações sobre época relativamente distante. Aparentemente desinteressantes, têm sido crônicas que atraem leitores, que talvez procurem algum resgate histórico ou afinidades existenciais, já que boa parte das vidas humanas tem traços comuns. Num recente programa de entrevistas, Jô Soares e Marília Gabriela comentaram que não escreveriam livros autobiográficos por não oferecerem muito interesse ao público. Discordo. Dependendo do conteúdo transmitido, qualquer autobiografia pode ganhar dimensão literária e atrair interesses diversos. Isto não significa que eu tenha a pretensão de publicar a minha, visto que, neste caso, meu mercado seria tacanho: parentes, bons amigos, poucos vizinhos e, talvez, colegas curiosos. Não que ache isto muito pouco, visto que seria minha terceira obra e as duas primeiras não foram propriamente “best sellers”. Quando a gente decide publicar, o que se busca é dar um testemunho, deixar um legado, fazer um desabafo. Não se pode viver em função do mercado e da mídia. O talento comercial e de comunicação de um Paulo Coelho é raríssimo, o cara ganharia dinheiro escrevendo bula de remédio. Não o considero bom, li algumas obras dele, que pouco me acrescentaram, mas devo respeitá-lo, inclusive por que foi parceiro do grande Raul Seixas. Por falar em fenômeno de massa, li há pouco tempo que Britney Spears, uma menina, vai escrever sua autobiografia por R$ 32,8 milhões. A reportagem assinalava que a vida da cantora deverá render de três a cinco livros publicados ao longo da próxima década. Bem-feito pra mim, que gostava tanto de ler e de estudar e tenho agora de bancar as edições de meus livrinhos. Mas a vida também é feita de caprichos e teimosia. Cada um no seu quadrado, ela que engane por lá e eu que fique me enganando por aqui. Nem posso criticar, porque estou louco para ler “Um século de boa vida”, de Jorge Guinle, o milionário simpático e sortudo que nunca trabalhou e acabou vivendo de favores na velhice. Como ele próprio explicou “pensava que iria viver só até os 80, mas como cheguei aos 88, me ferrei”. Valeu, "quando même"; afinal, um bom quarto no Copacabana Palace e mordomias decorrentes compensam outras carências materiais.

José Pedro Mattos Conceição
Enviado por José Pedro Mattos Conceição em 20/01/2009
Reeditado em 26/04/2014
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