A SOLIDÃO DE CADA UM
Geralmente quando quero escrever, isolo-me no quarto, onde há uma mesa, um notebook, livros e muitos pedacinhos de papeis, em cada um deles uma frase, uma palavra, um texto começado; são anotações que faço quando não estou em casa e me vem à mente uma idéia, um verso, uma imagem, uma paisagem bonita, as dificuldades e alegrias dos outros; não perco tempo, idéias são sempre valiosas.
Hoje busquei o meu quarto e ao sentar-me na cadeira em frente ao inanimado, mas indispensável computador, senti certo vazio, um devanear em relação ao que estar ocorrendo ao nosso redor. O ser humano a cada dia que passa, vai se isolando do mundo, das outras pessoas e então passa a conversar com a maquina, obra do próprio homem, um diálogo sem retorno, sem contestação, o que é pior, porque esse individuo passa a acreditar em si mesmo como o dono da verdade e contesta veementemente quando a opinião do outro vem de encontro a sua.
Após divagar por inúmeros recantos da reminiscência, pensei comigo mesmo em voz alta; não estaria eu, cansado por demais ou não seria isso um sintoma de solidão? E uma luz clareou a minha mente, que se fez interrogativa. E pensei: mas o que é a solidão? Eu nunca senti isso, não pode ser! Foi aí que me deparei escrevendo a solidão de cada um e ao mesmo tempo experimentando esse sentimento, que embora passageiro, em outros, houvera marcas por ela deixadas. Então estendi minha mão até a estante, apanhei o Aurélio, procurei e lá estava: "solidão estado do que se encontra ou vive só; isolamento", assim eu encontrei uma primeira explicação, para o meu estado solitário, nesse momento, não uma existência solitária, pois abomino a idéia de vida sob a reclusão.
Foi buscando entender esse sentimento que descobri ser a solidão um estado de espírito, pois, por vezes um individuo mesmo estando rodeado de pessoas, permanece como se sozinho estivesse, como se aqueles ao seu lado fossem invisíveis. Pude também compreender, que a solidão não é tão desesperadora como muitos afirmam. O ser humano necessita de seus momentos solitários, um tempo para ficar consigo e ouvir bem ao fundo de si mesmo a voz do silêncio. E como isso é importante para que se refaça o caminho, se mudem as atitudes e se reflita os feitos no dia de ontem.
Aos poucos fui descobrindo que essa solidão, faz parte da nossa estrada, desde o principio da vida do homem. Dei-me conta do que o meu pai falava quase sempre que parávamos para um bate-papo; saudosas conversas!
Interessante é que eu só parei para escutar o que ele falava, quando esse já beirava seus 70 anos, meu velho e eu sempre que juntos ficávamos, passávamos um bom tempo a conversar sobre a vida, eu o apelidei de o filósofo da vida; mas na realidade falávamos sobre tudo, principalmente sobre política, seu passatempo predileto, conhecia quase todos os políticos da época e através da leitura, conhecia de Deus ao diabo e era um leitor assíduo de "O Cruzeiro", não perdia um exemplar. Falávamos de família e foi ele um ardoroso defensor de agregação do homem a terra.
Na época, não consegui entender a frase que ele dizia: "O ser humano nasce sozinho e morre sozinho". Hoje, creio ter entendido o significado dessa sentença.
Quando a saudade bater fundo em seu peito e você sentir uma necessidade de estar apenas consigo mesmo, acredite esse momento é exclusivo de cada um, permita-se a um ligeiro afastamento das coisas materiais para repensar a vida, permita-se a esse instante de solidão; necessitamos, pois, dessa introspecção para ativarmos nossas defesas, contra o que chamo de solidão depressiva.
Creio que o meu pai, embora rodeado por seus filhos, na hora de sua partida, ele estava só, com ele mesmo, ou seja, seu momento único, sem a participação de qualquer vivente desse mundo, se havia do outro, "o mundo eterno", algum ser, não posso afirmar ou discordar é um mistério que o homem não desvendou e acho que nunca desvendará. Considero a passagem da vida a maior solidão enfrentada pelo individuo humano e sabem por quê? Porque desse afastamento não há retorno. Uma única exceção, segundo a História Bíblica, foi Jesus Cristo o filho de Deus.
Pus-me a pensar, quando da gestação de uma mulher durante nove meses, onde seu útero serve de abrigo para um ser, aproximadamente 270 dias, sob o aconchego da barriga materna, carinhos de todos aqueles que o aguardam do lado de cá, suaves roçar de mãos sobre a barriga da mãe e palavras carinhosas; apesar de tudo isso, essa criança estará apenas consigo mesma, e por assim ser, essa é a primeira solidão, efetivamente, pelo qual o homem passa.
E nós sabemos passar por esse processo de solidão; quando paramos para contemplar a natureza, seus habitantes, suas criações, seus relevos e porque não, ao contemplamos uma multidão ou simplesmente quando contemplamos o nada, absortos em nossos pensamentos, sozinhos, conosco mesmos.
Percebo que as pessoas vão aceitando a condição de solitário, quando em lugares populosos, das grandes cidades, ao entrarmos em um elevador e praticarmos a educação com um bom dia ou boa noite, as que ali se encontram, não retribuem esse ato de cortesia; estão tão imbuídos em si mesmos, que não percebem o outro ou fingem que não percebem.
Um outro sintoma desse isolamento humano ocorre, quando estamos em uma fila qualquer e as pessoas puxam conversas, falam e falam sem deixar espaço para que o outro possa responder, uns aceitam conversar, outros odeiam as conversas, ficam nervosos, reclamam e por vezes perdem a compostura. É o homem repelindo o homem, num processo gradativo de isolamento da espécie.
Quem sou eu, para contestar o que escreveu o grande poeta Fernando Antonio Nogueira Pessoa. Compreendo-o enquanto o que foi escrito refira-se a sua entidade humana: "A solidão desola-me; a companhia oprime-me. A presença de outra pessoa descaminha-me os pensamentos;", posto que, a mim, a solidão me renova em inspiração, a companhia me enche de alegria e a presença do outro me traz sempre uma criatividade, não importando o direcionamento, mas o prazer de vivenciar os fatos personificados me é imensurável. E que assim sejam aos que comigo compartilham a vida e o mundo em que vivemos.
Rio, 02 de novembro de 2008.
Feitosa dos Santos