NINGUEM CONHECE O OUTRO
Mesmo que vivêssemos uma eternidade, não seria suficiente para compreender a alma do homem. Este que sequer conhece o próprio princípio vital, não poderia compreender a fundo as necessidades emocionais e sentimentais dos outros.
Os estudiosos do assunto procuram adentrar esse abismo escuro que é a psique de cada individuo e por assim ser, quanto mais eles estudam, mais inteligíveis são as diferentes facetas entremostradas a cada ação a que é submetido o homem.
“Ninguém se amaria a si mesmo se deveras se conhecesse”, dizia Bernardo Soares/Fernando Pessoa. Um individuo agrega em sua vida, uma história, com suas dúvidas, seus fracassos e suas vitórias e quando se une a outro, as leva consigo, pois, estas são inseparáveis.
O ser humano procura desde muito jovem, um companheiro ou companheira, para que possam trilhar juntos um caminho menos íngreme, durante a sua permanência na terra. E quando ele pensa haver encontrado simplesmente ver nesse outro, o seu “eu” transfigurado e não o “ser”, o diferente em si, aquele que também possui defeitos e qualidades, carregando seus fracassos e vitórias, mas que pode equilibrar o fiel da balança, nesse novo caminhar. Sempre procuramos encontrar em outrem, aquilo que não conseguimos superar em nós ou o que entendemos como parte nossa; por certo, buscamos nesse um complemento ao vazio provocado por nossas nevroses, como se esse outro fosse uma porção que nos cabe, que nos pertence e que nos é devido; é óbvio que isso não passa de uma insensatez da mente humana, estimulada por nossa reduzida compreensão sobre o amor.
É visível a quem queira ver que o homem, sob o auspício cabalístico do sentimento amor, se reveste de reações tais como: falar, calar, chorar, sorrir, cobrar, se doar, projetar um futuro e desmoronar até o mais fundo do fosso, quando esse alguém não acompanha os ditames que supostamente se entende, como a regra do jogo, da sedução amorosa, para a plena e eterna felicidade.
André Comte Sponville, fala da felicidade com propriedade, quando diz: “A verdade é que para ser feliz é preciso renunciar à idéia de felicidade eterna, pelo menos no sentido em que a eternidade seria um tempo infinito”. Ao reafirmar a sentença anterior, vou além, não podemos buscar no outro aquilo que não temos em nós mesmos, assim como, abdicar da palavra ao não questionar o juízo do outro, aceitando-o como ergástulo de aprisionamento espiritual, suprimindo a liberdade de escolha, quando devia o homem, esbravejar pela liberdade no desenvolvimento das suas faculdades afetivas e que por certo, o tornaria mais fortalecido e confiante de suas ações.
Quantas e quantas vezes, através de palavras proferindo a verdade ou não, atos realizados ou mesmo não praticados, menções duvidosas, indecisões, ímpetos reativos entre outras ações praticadas, são conflitos que servem apenas para exemplificar em arrependimento, esse descuido para conosco e para com os outros, permitindo que a insensatez possa adicionar mais um entrave na vida do ser humano.
A ação reativa as argumentações provocadas pelo individuo que sofre ou que imputa a outrem, desajuste na manifestação amorosa, toma para si, em posse, o ente, por medo não desse, mas de si mesmo, em meio ao emaranhado e enigmático mundo do “incômodo amor”. Hugh Prater afirma: “Aparentemente, os adultos têm um medo profundo da felicidade”. E se olharmos com cuidado, não se observa nas crianças a potencialização de fatos diminutos, é por isso que essas, salvo as exceções, sempre trazem um sorriso largo em seus lábios, expressando uma felicidade radiante e contagiosa e, que nós adultos sabemos não ser eterna, em virtude das barreiras que deixamos de transpor e das muralhas que criamos ao longo de nossas vidas.
Assim sendo, a ansiedade toma posse de todo o nosso universo físico e psíquico, não permitindo que a libertação espiritual da alma humana, das suas raízes, transcorra com fluidez em nosso reto psiquismo.
Resta a nós, reinventar-nos para o futuro, compreender que “Somos, de certo modo, vários ao mesmo tempo e, ao mesmo tempo, somos os mesmos”, adequadamente afirma a Jornalista Marilia Mota. Resta-nos ainda, esquecer a frenética busca pela felicidade eterna, não permitindo que a nossa felicidade, esteja sob a projeção do outro, revendo os nossos sentimentos, nossas opiniões e acima de tudo isso, acreditar e compreender as necessidades individuais de realizações e opiniões decorrentes do indissolvível alcance do caráter, da responsabilidade e do sentimento do animal humano.
Que o homem e a mulher ame a si em primeiro plano, depois amem um ao outro e que ambos crêem que as palavras não substituirão jamais as convicções que os levem para o amor, mesmo que esse não seja eterno.
Rio, 25 de outubro de 2008
Feitosa dos Santos