Mico é escrever errado!
O meu texto “’Miguxês’ não é língua”, que publiquei aqui e em meu blog há algum tempo, teve uma repercussão tão positiva que os comentários que ouvi pessoalmente ou por e-mail me incentivaram a trazer o tema à tona, agora por um outro prisma. Para a maioria dos adolescentes que estão no Orkut é “mico” escrever corretamente nos recados enviados aos amigos. Ao contrário, dizer “dolu vc”, “xaudade”, “bjinhus”, “d+” e outras pérolas do miguxês é considerado por eles estar na moda, ser “da hora”.
É possível compreender essa vocação da adolescência para a contestação, para querer ser diferente, ser do contra. Nesta história toda, o irônico é que ser diferente é fazer bom uso da Língua Portuguesa, é não assassinar a gramática.
Gosto, às vezes, de perambular pelo Orkut para observar exatamente esse aspecto. Quando vejo um recado de um adolescente escrito de forma correta chego a traçar um perfil básico dele só por isto. Dá para deduzir que seja um bom aluno, alguém de opinião própria e emocionalmente mais seguro. Exagero? Taí um bom mote para pesquisas...
Ser diferente é perceber os movimentos da moda, absorver os bons aspectos deles, mas jamais se render às suas armadilhas. Mico é escrever errado! É não ter vocabulário para transitar com desenvoltura por espaços diversos. É ser conhecido como o que fala errado, o que dá foras nas rodinhas de amigos. Mico, ou melhor, gorila é escrever uma redação na escola e o professor circular o texto inteiro diante de tantos erros.
Minha cunhada, que reside na Bahia, enviou um recado no Orkut para me cumprimentar pela crônica e para dizer o quanto tem sido difícil manter um diálogo com seus alunos pela internet. “Têm pessoas no Orkut – meus alunos, por exemplo – com as quais não consigo manter diálogo, por não entender. Acabo ficando ‘muda’ e ‘surda’, porém eles se defendem dizendo que falar dessa forma é que ‘é moderno’, ‘teen’ e ‘tá na moda’. Até hoje não entendi uma mensagem da filha adolescente de uma grande amiga”, mencionou.
Outra amiga baiana, que é professora de Português e também leu o meu texto, contou que certa vez duas primas adolescentes chegaram a lhe perguntar por que ela escrevia tão certinho no Orkut. “Algumas vezes cheguei a sugerir a elas que escrevessem em português, pois eu não entendia nada e, consequentemente, não havia comunicação. A situação é tão preocupante que mesmo pessoas com acesso à educação acabam se influenciando tanto que não conseguem distinguir mais em quais situações elas podem usar tal variação. Tive uma experiência ano passado com alunos do Ensino Médio que utilizavam vários termos do ‘internetês’ em dissertações. Dá para acreditar?”
Depoimentos como esses, cada vez mais comuns entre professores e pais, revelam um problema bem mais abrangente do que um simples jeito errado de escrever a Língua Portuguesa. Mostram o desdém que as novas gerações vêm tendo com os adultos do seu convívio. Ficou para trás o tempo em que um adolescente respondia a um “bom dia” do professor assim que este entrava na sala. É mais do que um entrave de comunicação. Ou não?