A GENTILEZA ROMPE MURALHAS
Valéria Gurgel
Em tempos de incivilidades, um ser gentil se torna um tipo palaciano!
Atravessamos uma barbárie paradoxal. Onde uma das armas mais comuns a ser usada por muitos é a da invisibilidade.
É simples fingir não ver quem é tido como “diferente” de nós! Que seja uma pessoa com deficiência, ou por ter baixo poder aquisitivo, cognitivo, ou simplesmente por ter outra etnia, outro gênero, um porte físico fora dos padrões da beleza estimada, ou por ser idoso.
E o agravante de tudo isso é que com o passar dos anos, somados à todas as discriminações enunciadas, à medida que vamos somando mais passado que futuro em nossos anos de vida, percebemo-nos transparentes aos olhos dos outros, principalmente dos mais novos e dos padrões impostos pela sociedade!
Já não nos veem com os mesmos olhos da importância!
O distanciamento entre os chamados novos e os chamados velhos, os chamados privilegiados e os desprivilegiados do mundo é alarmante em nossa sociedade. O desinteresse em ouvir, aprender, ensinar, trocar experiências entre os dois polos, entre as duas realidades da vida constata o emburrecimento da humanidade.
E vamos desaprendendo os preciosos valores das convivências, o de se pensar, o de se refletir, o de se fazer sábias escolhas. Tudo isso somado ao baixo poder criativo, hoje em dia pouco se cria e muito se copia!
Ao constatarmos o envelhecimento acelerado e em grandes proporções da população no Brasil e no resto do mundo nos próximos dez, vinte, trinta anos seguintes, deveria ser emergencial acionarmos uma sirene intermitente em nossas consciências.
O ser que um dia pôde ter sido utilitário, vai envelhecendo e gradativamente perdendo a sua razão de existir e deixa de ser interessante, importante para os demais, um enfado. Mas, há quem se esquece de que o mundo em pouco tempo mais, independente das especificidades e particularidades humanas, terá mais pessoas idosas que crianças e jovens.
Essa constatação nos leva a crer na possibilidade de a humanidade correr sérios riscos de desaparecer em poucos séculos mais.
Começamos a entender como se dá esse processo do desvalor, da invisibilidade do ser vivo quando envelhece, e isso vale para os animais também, a partir da coisificação evidente, aplicada pelos seres tidos “humanos” aos seres vivos desde pequenos em nossa geração atual.
Raros são os que conseguem enxergar esse verdadeiro valor intrínseco do ser em um Ser e não os ver apenas como coisas, meros objetos utilitários!
Vivenciamos identidades hifenizadas, onde a massificação da in-sen-si-bi-li-da-de hu-ma-na, lamentavelmente vem ganhando proporções absurdas a cada ano.
Proliferam-se alienados que concatenam com os exércitos da aniquilação do saber e constroem muros de trevas nos distanciamentos.
Mais que nunca precisamos valorizar os saberes ancestrais, onde a mentalidade do coletivo, da união, da ética, das virtudes, formava raízes de paz. O celeiro onde se florescia a gentileza e seguia plantada no coração da terra, adubada pelo amor e pelo respeito, dando frutos de solidariedade entre os lares.
É inefável como essa sabedoria ancestral está interligada com a sensibilidade e bem-aventurança.
As expectativas de nutrirmos a afabilidade diante os resultados de uma educação outrora provinda do berço, com a educação que se diz familiar hoje em dia, onde muitas crianças nascem quase em um curral sem porteira, é inexorável.
E há quem solte os seus filhotes nas escolas, cada vez menores, mas, já quase indomáveis e os professores precisam aprender a fazer adestramentos milagrosos.
Ou se tornam culpados pelos resultados das estatísticas assustadoras da violência que cresce diariamente.
Sobretudo o de mais terrível e assustador que vem acometendo nossos inocentes e vulneráveis. Crianças, jovens, mulheres, pessoas idosas, pessoas com deficiências. Em todas as idades, em todos os sexos e gêneros a cada minuto, é o reflexo de todos os verdadeiros valores que estamos deixando se perder no tempo.
A gentileza rompe muralhas! Muralhas de problemas que parecem não ter solução.
Aprendamos o mais rápido possível a sermos gentis.
Porque a gentileza é uma qualidade em extinção.
@valeriacristinagurgel