A LINGUAGE DO POETA MATUTO
A LINGUAGE DO POETA MATUTO
Vô lhe conta uma históra!
Fui num sarau, certa vêiz,
e digo: Juro a vocêis;
fiquei c’á mente tristonha.
Pruquê um poeta letrado,
quando eu tava decramando,
de mim, foi se inciumando,
e quis me faze véigonha.
Adispôi qui eu decramei,
falando do meu amô,
de Jesus Nosso Sinhô,
e dais coisa do meu sertão;
o cabra se alevantô,
e antes de decramá,
in n’eu fiquiçando o oiá,
dixe: Esse poeta é bão!
Porém, a sua linguage,
é pobre e só num indioma.
A ôtas língua num soma,
e eu vô amostrá pra vocêis;
minha versatilidade,
decramando aqui, intão,
in portuguêis, alumão,
francêis, ispanhó e ingrêis.
Fiquei quétíin no meu canto,
pensando no qui fazê,
prumode me defendê,
daquela agressão, infim.
Lhe pidindo o microfone,
poeta Bob Motta,
para aquêle poligróta,
arrespostô mêrmo assim.
Meu povo, o qui êsse poeta,
aqui falô pra vocêis,
qui eu decramo in portuguêis,
sómente, é pura verdade.
Mais é qui adonde ele têve,
lendo incessantemente,
é pra lá de deferente,
da minha Universidade.
A minha Universidade,
insina a gente a vivê,
cum decença e merecê,
respeito e sê cidadão.
Ela fica lá no mato;
o vaquêro é o professô,
e o matuto é o reitô,
nais caatinga do sertão.
A sala de aula é o campo,
o currá é o iscritóro,
roçado é o laboratóro,
e nuis tempo de São João;
in cada canto, poeta,
daquelas festa animada,
ta ali, sendo preséivada,
todais nossas tradição.
Cuma você mêrmo dixe,
eu qui má sei portuguêis,
ir decramá in francêis ?
Pra mim é quage um insurto!
Mais nesse meu dialeto,
lhe amostro o qui qué dizê,
cada coisa, pode crê;
e mais, in verso matuto.
Se acauso tu num sabe,
agora passa a sabê;
SE AMÔITÁ é se iscondé,
quem faiz fofoca, FUXICA.
Mais ôto, mode inlustrá,
no meu verso, amostro agora:
Quem joga cunversa fora,
TÁ CUNVERSANDO ARITICA.
Rêde é FIANGA Ô TIPÓIA;
APRAGATA é o chinelo;
Guaxiníin, chamam GUAXÉLO;
touro preto é AZEITÃO.
Frouxo é AFOLOSADO;
BICHO CRUVIANA é o fríi;
ARRUPÊIO é arrepíi;
corretô é INTRUJÃO.
Rapariga é SURUPEMBA;
muié chifrêra é GALINHA;
bicha é AIMUFADINHA;
nuvióte é BAIBATÃO.
É assim, poeta letrado;
qui fala o cabra da peste,
do meu amado nordeste,
nais quebrada do sertão.
Na sua incolocação,
você num foi tão feliz.
E eu, esse eterno aprindiz,
digo, daqui de Natá:
A linguage da poesia,
num tem Pátria nem Nação;
na cidade ô no sertão;
é linguage universá...
Obs. Os vocábulos desconhecidos, ver em E-Livros, PRESERVANDO O MATUTÊS-LETRAS DA UNIVERSIDADE DO ROÇADO...Dicionário de nomes e expressões idiomáticas matutas, na sua segunda edição, com 5.169 verbetes na pronúncia do matuto nordestino; pesquisado por esse amigo de vocês, no interior do RN, PB,PE e CE; da década de sessenta até os dias de hoje.