A invasão da "tapaué" no sertão

A história é repleta

De muita dominação

Povos invadindo povos

Nação vencendo nação

Porém nada foi maior

Com conquista bem melhor

Que a tapaué no sertão

Esse negócio seu moço

E feito febre do rato

Basta comprar uma vez

Gruda feito carrapato

Vicia no mesmo dia

Que parece bruxaria

Mesmo sem nada barato

O Sertão que se servia

De pote de margarina

De frascos, garrafas pets

Não serve mais pra rotina

Pois a tal da tapaué

Chegou dando pontapé

Deixando tudo em ruína

Até potes de sorvetes

Útil pra guardar feijão

Caiu no esquecimento

E ninguém usa mais não

Sumiram das geladeiras

Estão cheias de poeiras

Chorando essa ingratidão

Eu até fico pensando

Que isso deve ser plano

Duma nação poderosa

Ou mesmo de marciano

Pra dividir nós matuto

Com esse sistema bruto

Que aumenta a cada ano

Nem padre Ciço previu

Essa nossa dependência

Um vasilhame de plástico

Causar bastante influência

Tem que ter explicação

Esse fato no sertão

Mudando nossa existência

Franscisquinha da Pamonha

Compra uma todo dia

Ainda entrou num consórcio

Com as filhas de Maria

Passou seis meses pagando

Por sorte acabou tirando

Um conjunto de bacia

Raimundo de Chico Peba

Inocente se lascou

Viu na mesa uma garrafa

Pelo cabaço trocou

Encheu levou pro roçado

Esse foi o seu pecado

A mulher quase o matou

Só porque a tal garrafa

Chegou um pouco arranhada

Zefinha quase uma santa

Ficou bastante zangada

Fumaçando pela venta

Bem quando Raimundo senta

Foi levando uma paulada

Dona Severina Gato

Enviou para Zefinha

Uma vasilha das grandes

Com goma, mel e farinha

Mas temendo a pandemia

Foi buscar no outro dia

Na cidade de serrinha

Já Tonha e Margarida

São comadres de respeito

Criaram os filhos juntas

Num ambiente perfeito

Pois nessa amizade antiga

Jamais existiu intriga

De nenhuma forma ou jeito

Porém toda essa harmonia

Que setenta anos viveu

Acabou-se faz dois meses

Pois tonha não devolveu

Um baby copo emprestado

Que levou leite de gado

Certamente se esqueceu

Damiana de Adelson

Fez um grande investimento

Vendeu três porcas paridas

Dez cabras e um jumento

Desmanchou em tapaué

Mas deu um tiro no pé

Pois só lhe causou tormento

É que a peste de um genro

Um pouco desavisado

Numa tapaué das brancas

Guardada com cadeado

Provou todo seu desleixe

Botando um caldo de peixe

Deixando o fundo manchado

Damiana quase infarta

Ficando muito doente

Mas o pior foi ao ver

A que ela deu de presente

A seu filho presepeiro

Desprezada no banheiro

Cheia de pasta de dente

Até o padre Juvenço

Caiu nessa tentação

No dia do padroeiro

Repaginou o leilão

Na festa de são José

Vendeu muita tapaué

Juntando quase um milhão

O sertão mudou de vez

Ninguém consegue explicar

A vinda desse utensílio

Encontrado em todo lar

De duração infinita

E com forma tão bonita

Vindo mesmo pra ficar

Tem vasilhas para tudo

Garrafa e espremedor

Copo, bacia, e concha

Faqueiro e escorredor

E tem até cuscuzeira

Que parece brincadeira

Pois suporta o calor

Pense um troço resistente

Só Deus sabe do que é feito

Dura a vida de um burro

Num quebra de nem um jeito

É pra frieza e quentura

Por isso a criatura

Deixa o povo satisfeito

Se Lampião fosse vivo

Sua Maria também

O cangaço se acabava

E não sobrava um vintém

As cangaceiras comprando

E do bando se afastando

Sem negar isso a ninguém

Nem couro de boi curtido

Supera em resistência

A bendita tapaué

É uma grande potência

Em toda casa presente

Nem todo esposo ciente

Que ta beirando a falência

E que as mulheres compram

E mantém bem escondido

O preço real da compra

Mentindo para o marido

Junto com a vendedora

A trama é vencedora

E o segredo tá mantido

Eu tenho muito aprendido

A marca tem me salvado

A TPM chegando

E o chocolate falhado

Eu compro uma tapaué

Dou de presente a "mulé"

E vivo bem sossegado

O sertão sem tapaué

Não tem como mais viver

E casamento sem elas

É difícil de manter

Mas amigo se atente

Faça tudo e não invente

De nas "tapaués" mexer

Lino Sapo
Enviado por Lino Sapo em 27/02/2021
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