NAS HORAS DE SOLIDÃO
Me sentindo solitário
De casa me retirei
Me meti de mata adentro
E num roçado passei
Na margem de um riacho
Numa pedra me sentei.
E no sopé de um morro
Nascia ali um riacho
As águas iam descendo
Rolando de morro abaixo
Vi uma formiga lutando
Contra as águas do riacho.
Ela queria subir
E continuava descendo
Lutando desesperada
De pedra em pedra batendo
Eu corri e fui salvá-la
Estava quase morrendo.
Numa réstia de sol
Deixei-a, a se aquecer.
E fiquei observando
O que ia acontecer
Se ela escaparia
Ou se iria morrer.
As águas desciam forte
Sobre as pedras rolando
Fazendo sulcos na terra
Raiz de pau arrancando
E sobre as águas calmas
Balseiros se acumulando.
Lembrei-me então da formiga
E lá estava ela a correr
Quando ela me viu parou
Como para agradecer
Depois saiu devagar
Sob as folhas a se esconder.
Eu voltei para a pedra
Onde sentado eu estava
Quando vi um beija-flor
Que de flor em flor bicava
Tirando delas o mel
Com que se alimentava.
Caminhei mais um pouco
E fiquei observando
Num poço de águas limpas
As piabinhas nadando
De um lado para outro
Aos cardumes se juntando.
E margeando o riacho
Devagar fui caminhando
Ouvi o murmúrio das águas
Como que cantarolando
Senti a brisa suave
Os meus cabelos soprando.
Senti neste momento
Minha alma se renovar
E suspirando bem fundo
Mandei as mágoas pro ar
E agradecendo a Deus
Uma prece fui rezar.
E esta minha oração
Com cânticos se misturava
Com a voz dos passarinhos
Que aquela tarde enfeitava
Matou toda a solidão
Que no meu peito morava.
Já era tarde e eu vi
A noite se aproximando
Ouvi o piar da coruja
E a curicaca gritando
E até a mãe da lua
Já estava assoviando.
O grito da siricora
O gemer da juriti
E o cantar assombrado
Do medroso bem-te-vi
E o roncar da cigarra
Que nós chamamos zumbir.
E o véu da noite caiu
Com tremenda escuridão
Mas eu estava alegre
Pois matei a solidão
Que feria e maltratava
Meu pobre coração.