Triste partida...

A seca me espantou para longe

Numa dolorosa partida

Na mala levei feridas

De uma dó que não se esconde

E sem saber para onde

Deixei minha casa amada

Cedinho de madrugada

Com uma sacola de lona

Sentei na quinta poltrona

Com a natureza amarrada

Vendi tudo que tinha

Pela metade do preço

Meu arreio e o cabresto

Meia dúzia de galinha

Até a casa de farinha

E o rodão de madeira

A roça de macaxeira

Deixei perdida no mato

Na parede restou o retrato

Que retrata minha vida inteira

Quinze anos se passaram

Voltei com tanta saudade

E o tempo com maldade

Muitos estragos causaram

Poucas coisas ali ficaram

O básico o suficiente

pra mim lembrar novamente

Da minha antiga morada

Que já foi movimentada

Dando abrigo a muita gente

Na porta azul da entrada

A foto de um candidato

O terreiro cheio de mato

Inclusive na calçada

A cancela ainda amarrada

Com uma corda caruá

E um pé de maracujá

Que toma conta do telhado

E o carro de boi encostado

Que tanto já ouvir cantar

Pendurei a mala num prego

No paredão de adobe

E no mesmo ainda coube

Meu antigo e velho terno

da tramela só o serno

Que sustentava a janela

Na estande a foto amarela

Ainda do meu batizado

E no fogão enferrujado

Uma trinca de panela

Essa cena é frequente

Na vida do nordestino

Que sai cedo sem destino

Pra encarar boca quente

De pedreiro ou de servente

Comendo arroz com ovo

Mas procura algo novo

para garantir o sustento

Povo de muito talento

Tiro o chapéu pra esse povo

Ivan Sousa
Enviado por Ivan Sousa em 16/08/2019
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