Triste partida...
A seca me espantou para longe
Numa dolorosa partida
Na mala levei feridas
De uma dó que não se esconde
E sem saber para onde
Deixei minha casa amada
Cedinho de madrugada
Com uma sacola de lona
Sentei na quinta poltrona
Com a natureza amarrada
Vendi tudo que tinha
Pela metade do preço
Meu arreio e o cabresto
Meia dúzia de galinha
Até a casa de farinha
E o rodão de madeira
A roça de macaxeira
Deixei perdida no mato
Na parede restou o retrato
Que retrata minha vida inteira
Quinze anos se passaram
Voltei com tanta saudade
E o tempo com maldade
Muitos estragos causaram
Poucas coisas ali ficaram
O básico o suficiente
pra mim lembrar novamente
Da minha antiga morada
Que já foi movimentada
Dando abrigo a muita gente
Na porta azul da entrada
A foto de um candidato
O terreiro cheio de mato
Inclusive na calçada
A cancela ainda amarrada
Com uma corda caruá
E um pé de maracujá
Que toma conta do telhado
E o carro de boi encostado
Que tanto já ouvir cantar
Pendurei a mala num prego
No paredão de adobe
E no mesmo ainda coube
Meu antigo e velho terno
da tramela só o serno
Que sustentava a janela
Na estande a foto amarela
Ainda do meu batizado
E no fogão enferrujado
Uma trinca de panela
Essa cena é frequente
Na vida do nordestino
Que sai cedo sem destino
Pra encarar boca quente
De pedreiro ou de servente
Comendo arroz com ovo
Mas procura algo novo
para garantir o sustento
Povo de muito talento
Tiro o chapéu pra esse povo